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sábado, 23 de junho de 2018

COMO DEVEMOS AGIR - ÉTICA E MORAL - TEORIAS ÉTICAS


1) O que é ética? Em que condições uma pessoa pode assumir a responsabilidade moral pelas ações que praticou? (p.230) 

Ética é o campo da filosofia que estuda a moralidade, na sua natureza e sua origem e seus problemas. Enquanto a moral se apresenta como um conjunto de prescrições, a ética busca empreender uma reflexão filosófica sobre a prática da moral. O sujeito da moral é responsável por suas ações quando age de forma livre e consciente. 

2) O que é egoísmo? A atitude egoísta é sempre imoral? O que é altruísmo? Para você, o altruísmo é uma tendência natural do ser humano ou só agimos em prol dos outros por causas das convenções sociais? Justifique sua opinião. (p.235) 

O egoísmo é uma atitude voltada para os interesses próprios, com pouca ou nenhuma atenção às necessidades alheias. A ação egoísta não é imoral em si mesma, mas se torna imoral quando se choca com valores morais como o direito à vida, o respeito a diferentes culturas, entre outros. Enquanto que o altruísmo pode ser definido como a prática de uma atitude que tem como motivação a realizações dos alheios. Pessoal. 

3) Como se caracterizam as teorias das virtudes? Qual delas você considera a mais importante? Por quê? (p.240) 

As teorias éticas das virtudes enfatizam a formação do caráter por meio da aquisição de bons hábitos. Pessoal. 

4) O que são os deveres? De que os modo os deveres se relacionam aos direitos? Qual é o fundamento da lei moral de Kant? (p.243) 

Os deveres são obrigações morais que devem ser seguidas por si mesmas, e não em função de suas consequências. Na teoria dos direitos e deveres, cada direito corresponde a um dever, em um sistema que deve tender ao equilíbrio entre os direitos e deveres e partindo do pressuposto de que existem direitos humanos dados pela natureza. Para Kant, o fundamento da lei moral é a razão e se expressa por meio do imperativo categórico. 

5) Em que consiste o princípio da utilidade? Qual é a diferença entre as concepções de moralidade de Benthan e Mill? (p.245) 

Para utilitarismo, a utilidade é a propriedade que propicia o maior benefício e o mínimo de prejuízo para o maior número de pessoas. A abordagem utilitarista de Benthan é de caráter quantitativo, enfatizando a utilidade da ação, enquanto a de Mill incorpora um aspecto qualitativo, enfatizando a utilidade das normas morais. 

6) O que são dilemas éticos? Mencione exemplos que você conheça ou possa imaginar. (p. 246) 

Os dilemas éticos envolvem geralmente situações de pacientes terminais que não tem mais chances médicas de recuperação e colocam questões como “Não seria melhor que o paciente morresse para aliviar o seu sofrimento e o da família?” ou Não seria melhor usar os recursos hospitalares com pacientes com chances reais de recuperação em vez de prolongar uma vida de sofrimento?”. Pelas entrevistas, pode-se perceber que as opiniões dos profissionais de sáude são diversas e há casos em que eles mesmos não sabem o que pensar ou fazer. 

7) O que é relativismo moral? Em sua opinião, existem preceitos morais universais ou são todos determinados por uma cultura e particular? Justifique. (p.248) 

Relativismo moral é uma concepção segundo a qual os valores morais são relativos, isto é, variam de uma cultura para a outra. Pessoal.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Direitos Humanos ou Direito dos Manos?


Quando adentramos numa disciplina de Direitos Humanos a primeira coisa que nos confronta é o senso comum de que o dito “Direitos Humanos” só serve para proteger bandido.

Mas, não é bem assim.

Os Direitos Humanos são direitos positivados e inalienáveis que se aplicam a todos os seres humanos pelo simples fato de serem humanos, pelo simples fato de existirem.

O problema atual da segurança pública do Brasil não guarda nenhuma relação com os Direitos Humanos, não são os direitos positivados causador da péssima eficiência do serviço público de segurança do país. O péssimo serviço prestado, pelas policias, está intimamente ligado com a má gestão dos políticos corruptos; e não com os direitos conquistados ao longo dos séculos a custa de sangue de inocentes.

Os infinitos recursos protelatórios no Direito Penal estão ligados com a má vontade dos deputados e senadores em modernizar o código penal, talvez com medo de serem pegos pelas próprias mudanças, afinal, grande parte dos congressistas estão envolvidos em escândalos e serão julgados pelo código penal que é anterior a Magna Carta, então o ideal é ser julgado por um código penal ineficiente e, com um código de processo penal que admita recursos intermináveis. Os Direitos Humanos não garante a impunidade como via para solucionar os problemas, pelo contrário, nos direitos positivados encontramos o direito a um processo célere que garanta ao acusado o amplo direito de defesa e um juízo imparcial.

Não podemos nos esquecer que os Direitos Humanos também protegem o direito à vida, à liberdade, à moradia, o direito de ir e vir, o direito de um juízo imparcial e etc.

Será mesmo que o problema são os Direitos Humanos? Será mesmo que o problema são os direitos positivados?

Está na hora de acabar com a falácia de que os Direitos Humanos só protege bandido.

Avancemos pela história e mudemos o rumo do nosso país.

FONTE: https://juridicocerto.com/p/ricarthe-oliveira1/artigos/direitos-humanos-ou-direito-dos-manos-4193

Direitos Humanos e Polícia - Perguntas e Respostas

1. O que são direitos humanos?

Direitos humanos derivam da dignidade e valor inerente à pessoa humana, e esses são universais, inalienáveis e igualitários. Isto significa que são inerentes a cada ser humano, não podem ser tirados ou alienados por qualquer pessoa; e todos têm os direitos humanos em igual medida – independente do critério de raça, cor, sexo, idioma, religião, política ou outro tipo de opinião, nacionalidade ou origem social, propriedades, nascimento ou outro status qualquer.

Eles são melhor entendidos como aqueles direitos constantes nos instrumentos internacionais: Declaração Universal dos Direitos Humanos, O Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, tratados regionais de direitos humanos, e instrumentos específicos lidando com aspectos da proteção dos direitos humanos como, por exemplo, a proibição da tortura.

2. Se os direitos humanos são inalienáveis e não podem ser tirados de nenhuma pessoa, isto significa que eles nunca podem ser limitados ou negados?

Não, isto significa que quando um direito é expresso por um código ou instrumento legal, os limites ou fronteiras devem ser definidos. Por exemplo, o direito à liberdade da pessoa pode ser limitado pelo exercício dos poderes legais de detenção ou prisão.

3. Você se refere a Instrumentos Internacionais, a Declaração, Pactos e Tratados. Qual é diferença entre esses?

“Instrumentos Internacionais” neste contexto significa todos os textos que englobam os padrões internacionais de direitos humanos. Alguns desses textos são tratados que obrigam os Estados-Parte que os ratificaram. Esses tratados são chamados de Pactos ou Convenções. A Carta das Nações Unidas também é um tratado que obriga os Estados-Parte.

A Declaração, referindo-se à Declaração Universal dos Direitos Humanos, foi adotada pela resolução 217 A(111) de 10 de dezembro de 1948 da Assembleia Geral das Nações Unidas. Não é um tratado que obrigue os Estados, mas há discussões entre juristas internacionais para que a extensão de seu conteúdo, total ou parcial, pode ser legalmente obrigatório aos Estados sob o aspecto do direito consuetudinário internacional (costumes). Algumas declarações ou resoluções, ou partes dessas, podem eventualmente se tornar mandatórias sob o aspecto da lei internacional, se as suas provisões demonstrarem que se tornaram prática habitual aceita pelos Estados. Se as provisões alcançarem esse status, podemos dizer que se tornaram direito consuetudinário internacional.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos e os dois Pactos dela decorrentes têm aplicação global. Os Pactos são obrigatórios aos Estados que os ratificaram, mas também existem tratados regionais tais como a Carta Africana de Direitos Humanos; a Convenção Americana de Direitos Humanos, e a Convenção Europeia de Direitos Humanos.

Outros instrumentos internacionais incluem códigos e princípios. Esses textos são adotados por organismos internacionais como a Assembleia Geral das Nações Unidas. Esses instrumentos não são obrigatórios por si só, mas eles reiteram e reforçam as provisões dos tratados, assistem e encorajam o cumprimento daquelas provisões estabelecendo padrões detalhados para aquela finalidade.

4. Os títulos dos dois Pactos Internacionais referem-se a dois tipos diferentes de direitos humanos. São eles igualmente importantes e relevantes para o trabalho policial?

A distinção surgiu, em primeiro lugar, pelo modo que os direitos neles constantes foram abordados na teoria. Em primeiro lugar, os direitos humanos foram considerados como clamor pela não intervenção dos governos na vida dos cidadãos. A primeira geração dos direitos veio a ser conhecida como direitos civis e políticos. Estes incluem o direito à vida, o direito à liberdade e segurança da pessoa; a proibição da tortura e tratamentos degradantes; direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; o direito à liberdade de opinião e expressão; o direito à liberdade de reunião pacífica e de livre associação. Pode-se facilmente verificar que direitos dessa natureza afetam diretamente e são afetados pelo trabalho policial.

Em seguida foi solicitado uma participação e intervenção positiva dos governos para promover a justiça social, que também deveriam ser considerados como direitos humanos. Esta segunda geração de direitos veio a ser conhecida como os direitos econômicos, sociais e culturais. Estes incluem o direito à seguridade social; direito ao trabalho; direito à educação; o direito à participação na vida cultural de sua comunidade. A relação entre o trabalho policial e esta categoria de direito é menos óbvia, mas existe.


Essas duas gerações de direitos são consideradas como indivisíveis e interdependentes de modo que se considera que o gozo de uma categoria de direitos está diretamente ligada ao gozo da outra. Neste sentido não podemos considerar que um direito seja mais importante que outro, apesar de, em certas circunstâncias, alguns direitos adquirem maior significado específico.

Os direitos em ambas categorias apresentadas são conhecidos como direitos individuais, pois cada indivíduo deve poder usufruí-los. Uma terceira geração de direitos conhecidos como direitos coletivos são agora reconhecidos, e isto incluiria, por exemplo, o direito ao desenvolvimento.

5. Uma das razões que policiais são tão reservados a respeito do conceito de direitos humanos é que, quando se fala em direitos humanos parece que estão mais voltados à proteção dos criminosos que às vítimas. Você considera que isto reduz o valor dos direitos humanos?

Não. A razão principal dos direitos humanos é lidar com um tipo específico de violação – o abuso de poder pelo Estado. Os padrões internacionais de direitos humanos têm o objetivo de prevenir que as pessoas se tornem vítimas desse abuso, assegurá-las e protegê-las caso isto aconteça. Algumas violações de direitos humanos são atos criminosos por si só – tortura, por exemplo, e execuções ilegais por funcionários do Estado.

Os criminosos também têm direitos humanos, por exemplo, têm direito a um julgamento justo e a um tratamento humano quando detidos. Uma vez sentenciados por uma corte de justiça pelo cometimento de uma ofensa criminal, eles perderão o direito à liberdade durante o tempo de cumprimento da sentença.


No que se refere aos policiais, estes devem entender que enquanto estiverem investigando um crime, estão lidando com suspeitos e não com pessoas que foram condenadas pelo cometimento de um ato criminoso (que está sendo investigado). Apesar de um policial acreditar que a pessoa realmente cometeu o crime, somente a justiça poderá considerar a pessoa culpada. Este é um elemento essencial para um julgamento justo, prevenindo que pessoas inocentes sejam condenadas por crimes que não tenham cometido.

Formas inadequadas de se fazer justiça, levando à condenação pessoas inocentes, (devido ao modo que a polícia desrespeita os direitos humanos), leva um descrédito ao trabalho policial e ao sistema judicial como um todo. A consequência é que as pessoas param de cooperar com a polícia, reduzindo a sua eficiência.

No que concerne às vítimas de atos criminosos, existe um instrumento internacional que estabelece padrões para o tratamento com essas pessoas – Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder.

6. Mas o que dizer das violações de direitos humanos cometidos por criminosos e terroristas?

A violação de direitos humanos somente pode ser cometida por uma pessoa com a autoridade e poder conferida pelo Estado e a exercê-la em seu nome. Nenhum criminoso ou terrorista tem essa dignidade ou esse poder. Quando criminosos ou terroristas ferem ou matam pessoas eles cometem atos criminosos, mas não cometem violações de direitos humanos. Isto não reduz o mal que fizeram e devem ser punidos pela lei pelos crimes cometidos.

Este ponto também pode ser ilustrado considerando-se a ação de um policial. Se este policial, durante seu trabalho, agride fisicamente um suspeito durante uma entrevista ou depoimento, intimidando essa pessoa a confessar um crime, essa ação seria considerada criminosa (lesão corporal ou tortura), mas também seria uma violação aos direitos humanos (proibição de tratamento degradante ou tortura). Mas, se por outro lado um policial não estando de serviço, agindo por conta própria venha a agredir alguém, esta ação seria criminosa, mas não uma violação dos direitos humanos.


Em ambos os casos apresentados o policial deverá ser punido pela lei criminal de seu país, mas, no primeiro exemplo, a vítima tem o direito de proteção e indenização do Estado.

Com respeito à prevenção contra tortura, identificação e punição das pessoas que a cometeram, os instrumentos internacionais estenderam a noção de responsabilidade para esta violação específica dos direitos humanos.

7. Assim sendo, em relação aos direitos humanos, policiais são considerados como delinquentes?

Não. A relação entre polícia e direitos humanos está centrada nas noções de proteção e respeito, e pode ser uma relação muito positiva.

De fato é função da polícia a proteção dos direitos humanos. Ela faz isso de maneira genérica, mantendo a ordem social, de modo que todos os direitos humanos, de todas as categorias possam ser gozados. Quando há uma quebra na ordem social, a capacidade e habilidade do Estado em promover e proteger os direitos humanos são consideravelmente diminuídos ou destruídos.

Ainda, é parcialmente por meio da atividade policial que o Estado atinge suas obrigações legais de proteger alguns direitos humanos específicos – o direito à vida, por exemplo.

Considerando o respeito, policiais devem respeitar os direitos humanos no desenvolvimento de suas atividades profissionais. Em outras palavras, considerando que é função da polícia a proteção dos direitos humanos, o requisito de respeito a esses direitos afeta diretamente o modo que a polícia desempenha todas as suas funções.

Isto também é um relacionamento positivo para o requisito de proteção aos direitos humanos, que estejam intimamente ligados ao desempenho das funções policiais. Por exemplo: direitos humanos são protegidos por lei, a polícia aplica a lei (faz cumprir a lei) com o objetivo de prevenir e detectar o crime, manter a ordem social e proteger os direitos humanos. Visto desse modo, a atividade de polícia consiste em desempenhar funções policiais, e ao mesmo tempo proteger os direitos humanos. Violar os direitos humanos, desrespeitar as normas legais como propósito de aplicar a lei não é considerado uma prática policial eficiente – apesar de algumas vezes se atingirem os resultados desejados. Quando a polícia viola a lei com o intuito de aplicá-la, não está reduzindo a criminalidade, está somando a ela.


O relacionamento entre polícia e direitos humanos é negativa, sendo os policiais vistos como delinquentes, quando esses mesmos direitos não são respeitados. Quando isso acontece, demonstra que o trabalho policial efetivo não está sendo desempenhado.

8. O cumprimento às proibições e limitações previstas nos instrumentos internacionais é um dos elementos do trabalho policial eficaz. Talvez o tratamento do tema seria menos crítico se a polícia tivesse uma visão mais positiva de direitos humanos e se os instrumentos legais expressassem mais que somente uma série de limitações e proibições na ação policial.

Os princípios que fundamentam os direitos humanos – respeito pela dignidade da pessoa humana, universalidade e inalienabilidade de direitos – não são proibições ou limitações, são ideais humanitários comuns apoiados no império da lei. Esses providenciam uma base muito positiva entre aqueles que exercem o poder estatal e aqueles em favor de quem é exercido – indivíduos e grupos na sociedade.

Os direitos que derivam desses princípios fornecem mais regras de comportamento do que de relacionamento. No que concerne à atividade policial, esses são requisitos positivos – respeitar o direito à liberdade e segurança da pessoa, ou conduzir investigações de um crime de modo que o direito a um julgamento justo seja assegurado.

Os códigos e princípios internacionais que referem à atividade policial providenciam uma orientação detalhada e de maneira positiva para diversas situações. Por exemplo, o Código de Conduta para os funcionários responsáveis pela aplicação da lei, das Nações Unidas abrange normas gerais e específicas de comportamento na matérias como uso de força (art. 3º), confidencialidade (art. 4º), proteção a pessoas detidas (art. 5º e 6º), e respostas a comportamento não desejável por colegas de profissão (art. 8º). O art. 1º requer altos padrões de responsabilidade e competência profissional. A resolução das Nações Unidas que adotou o Código (34/169 de 17 de dezembro de 1979) requer inter alia, que toda organização de aplicação da lei seja representante da sua comunidade no seu conjunto, bem como responder às suas necessidades e ser responsável perante ela. Esta é uma declaração muito positiva da natureza da função policial e o relacionamento das organizações policiais e as comunidades a que elas servem.

Os Princípios básicos sobre a utilização da força e de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei é outro instrumento. Seus 26 princípios propiciam exemplos práticos e detalhados para melhor prática no uso de força e armas de fogo pela polícia. Esses princípios expressam padrões positivos nas matérias como a criação de regras e orientações nacionais para o uso de força e armas de fogo (Princípio 1); o desenvolvimento de leque de meios tão amplo quanto possível e habilitar os funcionários responsáveis pela aplicação da lei com diversos tipos de armas e munições que permita o uso diferenciado da força e armas de fogo e adoção de material defensivo (Princípio 2); a circunstância na qual armas de fogo podem ser utilizadas contra pessoas (Princípio 9); treinamento de policiais (Princípio 20); aconselhamento contra stress para policiais; e responsabilidade individual de policiais e de seus comandantes (Princípios 24 – 26).

9. Policiais são naturalmente interessados na maneira que a lei é aplicada. Que medidas e sistemas existem para assegurar o cumprimento das leis internacionais de direitos humanos?

Em 17 de julho de 1998, a comunidade internacional decidiu, durante uma conferência diplomática, pela criação de um tribunal permanente – a Corte Penal Internacional – encarregada de julgar os crimes de guerra, crimes de genocídio, crimes contra a humanidade e etc.

Os vários mecanismos existentes atualmente para assegurar o cumprimento das leis internacionais de direitos humanos estão diretamente dirigidas a encorajar os Estados a criar e sustentar os arranjos legais de modo a implementar suas obrigações legais internacionais de proteger os direitos humanos. Estados são encorajados a cumprirem sua própria legislação nacional pelos meios disponíveis em sua administração quando existem violações de direitos humanos, protegendo compensando as vítimas.


Os mecanismos internacionais são de duas categorias – 1) corpos de princípios e procedimentos dentro do sistema das Nações Unidas(ONU), e 2) procedimentos baseados em tratados e procedimentos. No sistema da ONU, o organismo principal é a Comissão de Direitos Humanos, que é composta de 53 representantes dos Estados-Membros. A Comissão faz estudos, prepara recomendações e esboça instrumentos internacionais relativos a direitos humanos. Também desenvolve ações especiais designadas pela Assembleia Geral, e pelo Conselho Econômico e Social da ONU. Estas ações incluem a investigação de alegações de violações de direitos humanos e suas respectivas comunicações.

Ainda existem procedimentos especiais em relação à ONU. Pode consistir em uma pessoa “Special Rapporteur” ou pode consistir em um Grupo de Trabalho. Esses procedimentos especiais são de duas categorias: 1) procedimentos temáticos e, 2)procedimentos específicos a países.

Os procedimentos temáticos se dirigem a um tipo específico de violações. Por exemplo, em 1988 a comissão de direitos humanos estabeleceu um Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários com a atribuição de estudar o fenômeno. Foi indicado um “Special Rapporteur” para execuções extrajudiciais, um para Tortura, um para Intolerância Religiosa, e um Grupo de Trabalho para Detenção Arbitrária.

Os procedimentos específicos para países tratam das situações de direitos humanos em um país ou território em particular. Isso significa um grande número de países em todas as regiões do mundo.

Há ainda várias formas de procedimentos baseados em Tratados. Por exemplo, o Comitê de Direitos Humanos estabeleceu na Parte IV do Pacto Internacional pelos direitos civis e políticos, duas funções principais – supervisão e aplicação. Supervisão é conduzida por meio de relatórios, onde os países ratificadores do Pacto submetem relatórios periódicos sobre as medidas que adotaram e dão efetividade aos direitos reconhecidos no Tratado e progresso alcançado na fruição desses direitos. Aplicação envolve comunicação (denúncias) por indivíduos que alegam terem sofrido violações de direitos protegidos pelo Pacto, e ainda denúncias de Estados contra outros no que concerne a sua conduta.

Um Comitê contra a Tortura foi estabelecido pela Convenção contra Tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos e degradantes. Este Comitê recebe constantes relatórios de Estados ratificadores, examina a informação que aparenta conter indicações fundamentadas que a Tortura é sistematicamente utilizada naquele Estado.

Cada um dos 03 Tratados Regionais estabeleceram procedimentos que asseguram o cumprimento de suas provisões. Assim existe uma Comissão Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos; uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos e uma Corte Interamericana de Direitos Humanos, e uma Corte Europeia de Direitos Humanos.

Este são apenas alguns exemplos que existem de mecanismos de aplicação das normas. Outros ainda existem dentro do sistema das Nações Unidas e estabelecidos por meio de tratados.

O autor: RALPH CRAWSHAW é ex-policial britânico e agora do Centro de Direitos Humanos, trabalhando no campo de direitos humanos e trabalho policial.

'LIMITE DA PROPRIEDADE DA TERRA NO BRASIL NÃO ACABARIA COM AS GRANDES PROPRIEDADES'

O geógrafo Paulo Alentejano, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), conta nesta entrevista como o limite do tamanho da propriedade rural no Brasil pode reduzir a desigualdade no campo. Ao contrário do que os opositores da medida fazem parecer, ele explica por que a proposta não é radical e como outros países já limitaram o tamanho das fazendas, inclusive implementando reformas agrárias. Segundo o pesquisador, nenhum projeto de reforma agrária foi colocado em prática em toda a história do Brasil.

Qual é o quadro brasileiro em termos de concentração fundiária?
A concentração da propriedade da terra no Brasil é algo não apenas persistente como crescente. O Brasil está entre os países com maior grau de concentração, seja pelos dados do IBGE, seja pelos dados do Incra. O IBGE trabalha com a categoria de ‘estabelecimentos agropecuários’, que leva em consideração a unidade gestão, enquanto o Incra leva em consideração o documento de propriedade, trabalhando com imóveis. Pelo IBGE, a comparação é que a parcela dos maiores estabelecimentos, com mais de mil hectares, que são menos de 1% do total, tem 44% das terras, enquanto os menores estabelecimentos, que são 47% do total, somam apenas 2,36%. Ao se tomar como base os dados do Incra de imóveis rurais no cadastro de 2003, isso não é muito diferente – a grande maioria dos imóveis tem menos de 10 hectares, mas ocupam a menor área. Pelo Incra os dados mostram que propriedades com menos de 10 hectares são 31,8% do total e ocupam só 1,8% das terras agrícolas. Os imóveis com mais de cinco mil hectares são apenas 0,2% do total e tem 13% das terras.

E historicamente, como o país chegou a esta situação?
Esta história se inicia sem dúvida já com o processo da colonização, quando, através das chamadas Sesmarias, se distribui o controle da terra para poucos amigos do rei de Portugal. Eles passam a ter o direito de explorar a terra, mas também a responsabilidade sobre o controle político do território, em um sistema que articula economia e política. Há a exploração da terra, via exploração do trabalho escravo, e também controle político sobre o território, para que outras potências estrangeiras não viessem se apoderar disso. Então, há já no início da colonização o estabelecimento do latifúndio, que se reafirma em 1850 com a Lei de Terras. A lei transforma a terra numa mercadoria e, ao dizer que as pessoas só podem ter acesso à terra na medida em que têm recursos para comprá-la, alija os escravos que estão em processo de libertação, os imigrantes que vão vir para substituir os escravos, os homens livres e pobres. Mantém-se o monopólio da terra e a concentração após a Lei de Terras e ao longo de toda a história do século XX. E agora, no século XXI, as sucessivas tentativas de realizar a reforma agrária no Brasil foram barradas pelo poder político do latifúndio. Isso, inclusive, se acentua nos últimos anos em função do caráter da modernização que se deu na agricultura brasileira a partir dos anos 1970. Essa modernização vem reforçar a concentração, na medida em que aumenta a capacidade produtiva com a expulsão cada vez maior de trabalhadores da terra. Portanto, há uma persistência histórica da concentração da terra no Brasil que se refaz e se reforça até o momento pela incapacidade de os movimentos sociais transporem essas barreiras políticas e de modernização técnica.

Você considera que o Brasil em algum momento tentou ou colocou em prática algum projeto de reforma agrária?
O momento que chegou mais próximo disso foi antes do golpe [civil-militar] de 1964. Naquele momento existia uma mobilização muito forte no campo, as Ligas Camponesas, a União dos Trabalhadores da Agricultura, o Movimento dos Agricultores Sem Terra (Máster), havia uma diversidade grande de movimentos sociais rurais naquele momento, com uma articulação importante naquela história. E havia também por parte do governo João Goulart uma aposta na possibilidade da reforma agrária como parte das reformas de base. Entretanto, as forças conservadoras mais uma vez acabaram por triunfar. João Goulart anunciou em comício na Central do Brasil, no dia 13 de março de 1964, a desapropriação das terras localizadas nas imediações das rodovias e ferrovias federais. Menos de um mês depois houve o golpe militar, em 1º de abril, e uma das razões fundamentais foi justamente a reação à proposta de reforma agrária no Brasil. De lá para cá isso se repetiu muitas vezes: quando há uma força maior dos movimentos, há regressão do processo pela reação conservadora. Isso aconteceu em 1964, aconteceu com a Nova República, quando Tancredo Neves e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil construíram o primeiro plano nacional de reforma agrária e a UDR [União Democrática Ruralista] reagiu fortemente, esvaziando o plano, e, depois, na Constituição de 1988, quando a luta pela reforma agrária também foi esvaziada. Imaginava-se que o governo Lula iria efetivar a reforma agrária, construiu-se a perspectiva do segundo plano nacional de reforma agrária e, mais uma vez, a força do agronegócio se contrapôs com a justificativa de que tem uma importância enorme para a balança comercial. E aí se desconstruiu novamente a possibilidade da reforma. Então, reafirmou-se a todo momento este esvaziamento da reforma agrária. Quando os movimentos colocam na pauta as forças conservadoras se rearticulam e impedem que ela se efetive.

E há experiências em outras partes do mundo que tenham implementado propostas de reforma agrária que deram certo?
Podemos falar isso em movimentos que foram conduzidos na lógica da modernização capitalista, como é o caso dos Estados Unidos, que impuseram o processo na Ásia no final da Segunda Guerra Mundial - inclusive estabelecendo limite para o tamanho da propriedade da terra no Japão, na Coréia do Sul e em Taiwan. Na América Latina houve processos diferenciados e amplos de reforma agrária, alguns a partir da base, da mobilização popular - o caso do México é o mais emblemático, mas há também o da Nicarágua - e outras propostas de natureza reformista, como no Peru, no Chile ena Bolívia, em vários momentos históricos. A reforma agrária surge no mundo como uma medida de desenvolvimento do capitalismo e em outros casos foi associada a processos revolucionários, que é o caso da União Soviética, da China, de Cuba e outras situações sui generis. Então, a reforma agrária é algo que ao longo dos últimos 200 anos ocorre muitas vezes, em muitos países, com muitos sentidos e situações diferenciadas.Não há uma regra única para esse processo.

A reforma agrária não é então algo necessariamente radical, como fazem parecer ser?
Não, em alguns casos ela foi exatamente um processo de modernização capitalista. Aliás, na década de 1960, o governo Kennedy, nos Estados Unidos, formula na chamada Aliança para o Progresso a ideia de que era preciso fazer reforma agrária na América Latina para conter processos mais amplos à semelhança do de Cuba. Então, inclusive, há uma construção da reforma agrária como uma medida anti-revolucionária. No Brasil, nada disso se concretizou, nem sequer reformas agrárias tímidas pontuais, anti-socialistas ou anti-revolucionárias. Na verdade sempre foram obstaculizadas pelas forças do latifúndio que não abrem mão do monopólio da terra. A terra tem se constituído como um bem econômico, que significa poder político e que dá acesso a fundos públicos, este é um outro elemento fundamental. A terra no Brasil é um dos mecanismos de acesso a financiamento e isso é uma estratégia que faz com que grandes grupos econômicos sejam grandes proprietários de terra, embora não sejam exatamente grandes produtores. Hoje no Pará, por exemplo, o grupo Oportunity do Daniel Dantas tem enormes extensões de terra para pretensos projetos agropecuários como lavagem de dinheiro, evasão de impostos e uma série de mecanismos que existem também do ponto de vista financeiro e que justificam o controle sobre a terra.

Essa nova configuração que você descreve com a presença de grandes corporações também proprietárias de terra muda a correlação de forças no campo?
Sem dúvida. Embora o latifúndio seja persistente no Brasil, ele tem caras diferentes ao longo do tempo. O latifúndio já foi a cara do velho coronel das oligarquias agrárias, do senhor de engenho, e hoje o latifúndio, embora exista também assim, tem fundamentalmente a cara de grandes empresas capitalistas, grandes monopólios financeiros, grandes empresas transnacionais e grandes grupos empresariais brasileiros também, que, inclusive, se utilizam de instrumentos como grilagens de terras para se apropriar das terras públicas, e se utilizam de trabalho escravo ainda hoje. No ano passado, o Rio de Janeiro foi o estado com o maior índice de trabalho escravo no Brasil em função de casos identificados na usina Santa Cruz, que é arrendada pelo grupo J. Pessoa, o maior grupo usineiro do Brasil. Então, não estamos falando de um coronel atrasado no sertão, mas de grandes grupos empresariais, que trabalham com trabalho escravo aqui e altíssima tecnologia lá. O capital hoje articula as formas mais desenvolvidas possíveis tecnologicamente com as formas mais arcaicas de exploração do trabalho, não há contradições desse ponto de vista. Então, são interesses extremamente poderosos que existem hoje contra qualquer tipo de reforma agrária, e por que isso? Porque mesmo o agronegócio dito altamente produtivo necessita permanentemente de terras novas para sua expansão. Até porque desgasta profundamente o solo e, desgastando o solo, precisa de novas terras para se expandir, e se não tiver estoque de terras improdutivas não tem para onde avançar e não tem com se recompor. Por isso há uma necessidade desses setores, mesmo os ditos mais desenvolvidos da agricultura brasileira, de manterem estoques de terras paradas e situações arcaicas de produção. Por que os empresários não aceitam a atualização dos índices de produtividade para desapropriação de terras para reforma agrária, que são de 1975? Porque necessitam permanecer com estoque de terra parada para que ele possa lançar mão em algum momento.

Esta proposta de atualização dos índices de produtividade também foi bastante combatida. Como está esta discussão?
A lei agrária de 1993 estabelece que por decreto interministerial os índices serão atualizados de tempos em tempos. E quando a lei estipulou os índices, o fez com base em dados super atrasados, do censo de 1975. Desde o primeiro governo Lula existe uma proposta de atualização dos índices de produtividade feita pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que está na mesa do gabinete civil da presidência para que seja assinado. A proposta nunca foi efetivada porque tem que ser um decreto interministerial e tem que ter assinatura do MDA e também do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que é o ministério que representa os interesses do agronegócio, do latifúndio, da grande propriedade da terra no Brasil. Os sucessivos ministros da agricultura sempre negaram acordo para atualização dos índices de produtividade e a força política deles sempre foi a bancada ruralista, que sempre disse que se houvesse atualização dos índices de produtividade o governo Lula perderia qualquer apoio deles. Então, há um processo claro de pressão política da bancada ruralista, que beira a chantagem, para a não atualização dos índices de produtividade e o governo Lula sucumbiu à força política destes setores.

E essa proposta atualiza os índices com base em que dados?
Ela utiliza os Censos Agropecuários de 1995 - 1996, não chega nem a utilizar o de 2006, até porque a proposta foi feita antes de o Censo ser liberado, e utiliza também os estudos da Embrapa e uma série de estudos para fazer a atualização desses índices. Mesmo utilizando os dados da década de 1990, melhoraria substancialmente em relação aos índices de produtividade de 1975. De lá para cá, os índices médios de produtividade subiram substantivamente.

Para além desta discussão do limite e dos índices de produtividade, existe a proposta de um novo modelo para a agricultura brasileira levantado pelos movimentos sociais do campo. Quais são as bases deste modelo?
A proposta do movimento e de setores que trabalham próximos aos movimentos do campo vai em quatro direções fundamentais. A primeira é a necessidade de romper com a histórica concentração fundiária, porque isso produz injustiça e desigualdade. A segunda é chamar atenção para o processo recente de internacionalização que a agricultura brasileira vem sofrendo, que se expressa também na compra de terras pelos estrangeiros.– Parece que agora o governo tentará alguma medida de restrição a isso, mas problema não se resume à compra de terras. Essa questão passa, por exemplo, pela crescente dominação das empresas transnacionais sobre a agricultura brasileira, impondo um aporte tecnológico com sementes, agroquímicos e a própria compra da produção agropecuária que cada vez mais é controlada pelas grandes empresas internacionais. A terceira crítica é que, em função do latifúndio, há uma tendência cada vez maior de que se privilegie no Brasil a produção de matérias primas industriais e produtos para exportação, que interessam aos grandes grupos estrangeiros, e não a alimentação da população brasileira. Cada vez mais tem se ampliado no Brasil a produção de soja, de milho, de cana de açúcar, monoculturas de eucalipto e de pinho para produzir celulose, contra a área destinada à produção de arroz, de feijão, dos alimentos básicos. É um modelo produtivo que atende a interesses externos e não àquilo que seria fundamental para ampliar a segurança alimentar da população brasileira. E o quarto elemento fundamental é que este modelo agrário vem acompanhado de uma lógica da violência, que expulsa trabalhadores do campo de forma violenta, realiza o trabalho escravoe explora altamente o trabalho daqueles poucos que sobram no campo. Um exemplo é a situação dos cortadores de cana que, para competir com as colheitadeiras. têm que aumentar cada vez mais a produtividade do seu trabalho, e isso implica jornadas cada vez mais exaustivas e problemas de saúde cada vez mais danosos aos trabalhadores. O outro elemento que também é conseqüência deste modelo é a devastação ambiental, o avanço sobre as florestas - está aí a pressão toda para se mudar o Código Florestal para poder avançar ainda mais este processo de desmatamento. E aliado a isso há também um crescente uso de agroquímicos que fazem do Brasil hoje o campeão no uso de agrotóxicos, com um grau cada vez mais intenso de contaminação dos alimentos que ingerimos. É nesse sentido que os movimentos tem se contraposto a isso com o limite da propriedade da terra, a proposta da agroecologia como base de uma produção que ao mesmo tempo evite a devastação e conviva com os ecossistemas de forma mais equilibrada, e, sobretudo, não use essa enormidade de agrotóxicos que vem sendo utilizada. Esta proposta se baseia também em relações de trabalho muito mais justas do que as que estão colocadas atualmente.O conjunto desaas coisas é que está colocado como o contraponto da articulação. A crítica a esse modelo agrário dominante se rebate na defesa de um outro modelo que embasaria a proposta de reforma agrária, com base na democratização das condições de vida no campo e na rejeição desaas características que estão postas com este modelo - violência, superexploração do trabalho e devastação ambiental.

De acordo com a marcação do Incra, propriedades com mais de 15 módulos fiscais são consideradas grandes. Então, mesmo com a limitação em 35 módulos fiscais proposta pelo plebiscito, ainda teremos grandes propriedades no país. O que precisa ser esclarecido nesse sentido à população?
Pela legislação brasileira, imóveis de um a quatro módulos fiscais são considerados como pequena propriedade, de cinco a 15 são média propriedade e, acima de 15, grande propriedade. E o módulo varia de região para região de acordo com qualidade do solo, clima, infraestrutura, proximidade dos mercados. Tudo isso influi na definição do módulo fiscal de tal maneira que há módulos de 5 hectares, próximos aos grandes centros, até 110 hectares, que é o maior que temos no Brasil. Com a proposta do limite em 35 módulos fiscais, o tamanho variará de 175 hectares, próximo aos grandes centros, o que é muito, até 3.500 hectares em áreas mais distantes como a Amazônia. Veja que a proposta não está propondo acabar com a grande propriedade, que é acima de 15 módulos fiscais, está apenas acabando com as gigantescas - trata-se de reduzir a desigualdade e não acabar com ela. Então, não é no nível de radicalidade que alguns países fizeram. Há países no mundo que estabeleceram limites muito mais restritos para a propriedade da terra, como no Japão, onde o limite é de 12 hectares, ou na Coréia do Sul, que é de três hectares. O limite que estamos propondo para o Brasil chega a 3.500 hectares e isso significa que propriedades do tamanho de aproximadamente 3.500 campos de futebol poderiam ser permitidas no país, variando de região para região. É uma proposta extremamente eficaz porque, atingindo apenas 50 mil imóveis, o que corresponde a 2% dos imóveis rurais do Brasil, seria possível obter 200 milhões de hectares para a reforma agrária. Isso corresponde a quase 40% do total da área dos imóveis do Brasil. Portanto, atingindo muito poucos, permitiria-se um avanço muito grande da reforma agrária, beneficiando muitas populações do campo e da cidade. É uma medida com impacto extremamente positivo do ponto de vista social no Brasil.

Existe uma dimensão da demanda por terra no país?
Existem várias projeções em relação a isso. Há aquelas que trabalham com número de famílias acampadas, que seria a demanda mais direta pela terra, cuja estimativa é de 150 a 200 mil famílias acampadas. Tem uma estimativa que toma como base uma proposta do governo Fernando Henrique, de cadastro de interessados via correio, que chegou a 800 mil famílias cadastradas. E há dados do Censo Agropecuário que apontam os que seriam os assalariados em condição precária no campo: os arrendatários, parceiros, de forma geral, os trabalhadores rurais sem terra - que chegariam a quatro milhões de famílias aproximadamente. Se agregarmos isso ainda a milhões de famílias que foram expulsas do campo e vivem precariamente nas cidades, e algumas delas podem ter interesse em voltar para a terra, isso poderia chegar a 10 milhões de famílias. Há variadas possibilidades de mensurar, desde a forma mais direta até a mais indireta. E de fato a medida poderia resolver tranqüilamente essa demanda. Neste sentido, o plebiscito é muito importante como instrumento de mobilização, de conscientização da sociedade em relação aos seus problemas, assim como os outros plebiscitos populares, como o da Alca, o da Vale e o da Dívida Externa. O objetivo, sobretudo, é provocar o debate na sociedade sobre a importância destas questões. E neste caso, a importância fundamental que tem a reforma agrária para o campo e para a cidade, para transformar esta realidade brasileira. O plebiscito tem dois objetivos fundamentais: o primeiro é o de colocar o debate para a sociedade, e o segundo é, através do número de votos que se obtiver e das assinaturas que irá se recolher neste processo, poder impulsionar a proposta de emenda constitucional que visa a estabelecer efetivamente o limite para o tamanho da propriedade no Brasil. Não temos ilusão de que isto será uma batalha fácil, pelo contrário, mas é através do plebiscito que se coloca isso mais amplamente para a sociedade, o que pode vir a gerar a pressão popular necessária para que isso possa acontecer. De alguma forma o plebiscito da Alca teve esse efeito, pelo menos tensionou o governo brasileiro para a questão e demonstrou que havia uma quantidade expressiva de brasileiros que rejeitava a proposta da Alca.

FONTE: http://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/entrevista/limite-da-propriedade-de-terra-no-brasil-nao-acabaria-com-grandes-propriedades