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domingo, 11 de novembro de 2018

A LAGOA DA FORMOSA

Por Jean Carlos Gonçalves.
A riquezas de Tuntum-MA e o risco da perda de nosso patrimônio ambiental.
Lagoa da Formosa, município de Tuntum-MA
Foto: Profº Leno Carlos, julho/2007.
A imagem acima, foi produzida em julho de 2007, por ocasião em que alguns professores da cidade de Tuntum-MA, decidiram realizar uma viagem até a nascente do Rio Flores, que se localiza no povoado Brejo do Cazuza, no município de Fernando Falcão, o qual se limita ao sul e sudoeste ao município de Tuntum.

Durante o trajeto de mais de 120 Km, os professores Aldenizio Pinheiro, Enilson Leitão, Jean Carlos, Leno Carlos e Marcleudes Barnabé, tomaram conhecimento de que havia na região, uma imensa lagoa, no povoado Lagoa da Formosa, fazendo jus ao próprio nome.

A bela lagoa que dista uns 6 Km do povoado Santa Rosa, no Alto Sertão tuntuense, guarda uma história bastante interessante, pois segundo os próprios moradores do povoado, a mesma teve origem quando um índio da tribo dos canelas foi fazer um melhoramento de uma cacimba. Ao cavar um pouco mais o nativo atingiu um veio d'água que em pouco tempo formou a imensa e profunda lagoa. Durante uma conversa que tivemos com maradores locais, afirmaram que nunca alguém conseguiu mergulhar e tocar no fundo. E que antes o espaço que a lagoa passou a ocupar, era local onde o gado criado à solta, permanecia, desfrutando da pastagem natural e da sobra das árvores.

Entretanto, nos últimos dias, recebemos informações de sertanejos da região que a Lagoa se encontra em tamanho bastante reduzido, devido, principalmente, ao desmatamento que os proprietários fizeram no seu entorno.

O problema do desmatamento das matas ciliares no Alto Sertão de Tuntum é bem antigo. Quando a Carlota Carvalho publicou em 1924 sua memorável obra, O Sertão, importantíssimo para se compreender o processo de povoamento da região dentre outros aspectos, faz referência ao problema. A autora registra a memória dos seus antepassados que habitaram no antigo Arraial do Campo Largo na primeira metade do século XIX, próximo da Lagoa da Formosa, conforme citação abaixo:
"Na vizinhança onde foi o arraial do Campo Largo, do qual só existe a recordação histórica, há outro povoado, o Leandro, habitado por cearenses muito trabalhadores mas que destroem os matos secando  as nascentes, esterilizando a terra e preparando a seca sem propósito de fazem o mal, somente por efeito de crassa ignorância e não da falta de escola oficial." ( CARVALHO, Carlota, O Sertão, 1924, p.112).
Passados quase 200 anos do início da colonização da região, o problema da ignorância sobre a questão ambiental permanece. Na época da fundação das aludidas povoações, ambas pertenciam ao antigo território da Freguesia da Chapada (atual Grajaú), em seguida passaram a fazer parte do município de Barra do Corda. Com a emancipação do município de Presidente Dutra (antigo Curador), o Campo Largo, passou a integrar seus domínios. A partir de 1955, o antigo povoado, passa a fazer parte do então, recém criado, município de Tuntum. Já o Leandro, passou a integrar o território do município de Fernando Falcão, após desmembramento do município de Barra do Corda, em 1994.

Por enquanto, deixamos aqui a única imagem da lagoa que consegui resgatar, com a esperança de que os ventos da consciência ecológica cheguem aos nossos irmãos sertanejos.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Tempos histéricos

Por Flávio Siqueira
Tempos histéricos. Polarizados. Gente apaixonada crendo na guerra do bem contra o mal. Buscam heróis que não admitem contestação e os defendem com toda a força de suas angústias. O manipulado é o outro. Sempre.

Onde está a lucidez? A semente da raiva cultivada amadurece em disfarces patrióticos, no vermelho ou no verde amarelo. Confusão disseminada em nome de justas causas. Medo, muito medo.

Controla-se a linguagem, aprisionam-se as mentes, diminuindo-as, diminuindo-as, diminuindo-as, até que o pensamento livre seja uma afronta. Em tempos histéricos, pensar representa a pior heresia e os hereges devem ser punidos pelas santas inquisições das redes sociais. Não há espaço para contestações de nenhuma natureza: espera-se adesão. Cega, voluntária, subserviente.

Manipula-se criando inimigos. Manipula-se criando heróis. Arregimentam devotos e os fazem lutar em nome da verdade dos próprios algozes. Ovelhas apaixonadas por lobos até que sejam devoradas.

Massas nutridas por hashtags brigando entre si, compondo cenários que serão aproveitados cinicamente no próximo programa eleitoral, onde a demagogia e o sofrimento convivem tão bem.

Distraídos. Devotos de perversos padroeiros que no fim se juntarão para dividir o espólio.

Não há remorsos.

Eles sabem que povo continuará, como sempre, esperando o surgimento dos próximos heróis. E eles sempre aparecem.

Tempos histéricos. Onde está a lucidez?

domingo, 26 de agosto de 2018

INTERTEXTO

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.

(Bertolt Brecht)

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Perguntas e respostas sobre trabalho escravo

Foto: Fotos: Leonardo Sakamoto, no banco de imagens do Especial PEC do Trabalho Escravo.

1) Em poucas palavras, o que é trabalho escravo?
É quando o trabalhador não consegue se desligar do patrão por fraude ou violência, quando é forçado a trabalhar contra sua vontade, quando é sujeito a condições desumanas de trabalho ou é obrigado a trabalhar tão intensamente que seu corpo não aguenta e sua vida pode ser colocada em risco. Trabalho escravo não é apenas desrespeito a leis trabalhistas ou problemas leves. É grave violação aos direitos humanos.

2) O conceito de trabalho escravo é frágil?
Não, não é. O artigo 149 do Código Penal, que prevê de dois a oito anos de cadeia para quem se utilizar dessa prática, é de 1940 e foi reformado em 2003 para ficar mais claro. Ele prevê o crime em quatro situações: cerceamento de liberdade de se desligar do serviço, servidão por dívida, condições degradantes de trabalho e jornada exaustiva.

3) Quem concorda que o conceito atual é bom?
Tribunais já utilizam, sem problemas, o conceito de trabalho escravo. A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal tem aceitado processos por esse crime com base no artigo 149. A Organização Internacional do Trabalho e a relatora para formas contemporâneas de escravidão das Nações Unidas, Gulnara Shahinian, elogiam o conceito brasileiro (ao contrário do que querem fazer crer algumas declarações de parlamentares que distorceram suas palavras e documentos). O governo federal, as empresas do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (que reúne as maiores empresas do país) e organizações sociais brasileiras defendem a manutenção do atual conceito de trabalho escravo. O Comitê de Peritos da Organização Internacional do Trabalho, composto por 20 dos mais respeitados juristas do mundo, vem reafirmando que a Convenção 29, que trata de trabalho forçado, inclui condições degradantes de trabalho. Considerar condições degradantes como trabalho escravo não é algo que surgiu do nada, mas veio de uma evolução do conceito e do combate a esse crime.

4) Vale a pena ceder um pouco no conceito para aprovar a PEC?
Não. Todo o sistema de combate ao trabalho escravo no país está fundamentado no atual conceito de trabalho escravo. Se ele for alterado, o sistema desmorona e milhares de trabalhadores ficarão sem receber seus direitos. Além disso, pela Constituição, o Brasil não pode retirar proteção do trabalhador – o que aconteceria com mudanças no conceito como querem alguns parlamentares.

5) “Condições degradantes de trabalho” é um termo impreciso, não?
Não, de forma alguma. O que está tutelado no artigo 149 não é apenas a liberdade, mas sim a dignidade da pessoa humana. Somos seres humanos porque nascemos iguais em direito à mesma dignidade. E, portanto, temos os mesmos direitos fundamentais que, quando violados, nos arrancam dessa condição e nos transformam em coisas, instrumentos descartáveis de trabalho. Ou seja, é importantíssimo que se mantenha a punição para quem desrespeita a dignidade do trabalhador, sujeitando-o a condições de alojamento, alimentação, trabalho, saúde, segurança desumanas. Condições degradantes é configurado por um conjunto de autuações contra situações que colocam em risco a saúde e a vida do trabalhador. Nunca alguém foi considerado em situação degradante por falta de copo plástico ou espessura fina de colchões.

6) “Jornada exaustiva” é um termo impreciso, não?
Não, de forma alguma. Jornada exaustiva não é trabalhar por muitas horas seguidas. Caso contrário, um médico ou um jornalista de plantão estariam nessa situação. Jornada exaustiva não tem a ver com a duração da jornada, mas como a saúde e a segurança do trabalhador são negadas durante essa jornada. Jornada exaustiva caracteriza-se quando o trabalhador é submetido, de forma sistemática, a um esforço excessivo, com tal sobrecarga de trabalho e sem tempo suficiente para se recuperar fisicamente que pode ter danos à sua saúde ou estar em risco de morte. Na jornada exaustiva, nega-se o direito de trabalhar de forma a proteger sua saúde, garantir o descanso e permitir o convívio social. Assume importância a análise do ritmo de trabalho imposto ao trabalhador, quer seja pela exigência de produtividade mínima por parte do empregador, quer seja pela indução ao esgotamento físico como forma de conseguir melhora na remuneração ou a manutenção do emprego. Um bom exemplo são as duas dezenas de cortadores de cana de açúcar que morreram de tanto trabalhar no interior do Estado de São Paulo nos últimos anos.

7) Há produtores rurais que foram autuados por trabalho escravo devido à distância entre beliches, espessura do colchão, falta de copos para beber água, de carteira assinada e de um local adequado para refeições.
Mentira. Esse é um argumento facilmente desconstruído. Quando um auditor fiscaliza um produtor, ele emite autos de infração sobre todos os problemas encontrados. Mas não é auto de infração de colchão fino que configura o trabalho escravo. Quando ouvir um produtor ou parlamentar dizer isso, pergunte sobre os outros autos de infração recebidos, sobre os quais nunca alguém quer falar. Além do mais, não é apenas um auto que caracteriza trabalho escravo, mas um pacote deles, mostrando as péssimas condições dos trabalhadores.

8) O atual conceito causa insegurança jurídica porque ninguém sabe o que é trabalho escravo.
Não, isso é uma falácia. A tentativa de mudar um conceito conhecido e aplicado é que vai levar à insegurança jurídica, com milhares de processos tendo que tomar um novo rumo, trabalhadores desconhecendo seus direitos, produtores rurais na dúvida de que decisões tomar. Até porque qualquer mudança, seja no artigo 149, seja em lei específica, será questionada não apenas junto ao STF, por reduzir a proteção do trabalhador, mas também nas Nações Unidas e na OIT. O que é melhor? Um produtor reconhecer esse conceito como válido e se adequar ou uma guerra jurídica de anos? Há parlamentares que consideram o conceito inseguro porque, na verdade, não concordam com ele.

9) Por que se usa a expressão “trabalho análogo ao de escravo”?
Porque o trabalho escravo foi formalmente abolido em 13 de maio de 1888 e o Estado passou a considerar ilegal um ser humano ser dono de outro. O que permaneceram foram situações semelhantes ao trabalho escravo, tanto do ponto de vista de cercear a liberdade quanto de suprimir a dignidade do trabalhador, tratando-o como uma coisa, um objeto comercializado, não como um ser humano.

10) O que vocês chamam de trabalho escravo é apenas a cultura da região ou desrespeito à legislação trabalhista.
A justificativa é falsa, embora seja comumente usada por alguns empresários. Mesmo que a prática fosse comum em determinada região – o que não é verdade, pois é utilizada por uma minoria de empregadores – jamais poderia ser tolerada. Todo e qualquer crime deve ser combatido, com maior força exatamente onde for mais usual a sua prática. O desrespeito à dignidade ou o cerceamento da liberdade não podem ser encarados como manifestação cultural de um povo ou desrespeito à legislação trabalhista, mas sim como a imposição histórica da vontade dos mais poderosos e como crimes contra os direitos humanos. Além do mais, essa suposta “cultura da região” é compartilhada apenas por aqueles que concordam com o trabalho escravo, uma vez que a população mais pobre, vítima da escravidão, tem lutado desde a década de 70 para que seus direitos sejam efetivados.

11) Por que ao invés de resgatar trabalhadores, o governo federal não faz visitas prévias para esclarecer os empregadores, dando um tempo para que eles se adequem?
Se trabalho escravo fosse apenas um desrespeito à legislação trabalhista, isso seria possível, como ocorre quando são flagrados trabalhadores sem carteira de trabalho assinada ou com problemas mais leves de saúde e segurança, por exemplo. Mas trabalho escravo é um crime contra os direitos humanos, atentando contra a dignidade ou a liberdade do trabalhador. Nesse sentido, não faz sentido que, uma vez encontrados trabalhadores em condições deploráveis de trabalho, os auditores fiscais, procuradores e policiais deixem essas pessoas nessas condições. Pelo contrário, o que tem se verificado é que, sabendo com antecedência da visita da fiscalização, empresários mandam embora seus trabalhadores nessas condições para não serem flagrados. Muitos vezes sem receber nada.

12) A culpa não é do empregador e sim de gatos, gerentes e prepostos. O empresário não sabe dos fatos que ocorrem dentro de sua propriedade e por isso não pode ser responsabilizado.
O empresário é o responsável legal por todas as relações trabalhistas de seu negócio. A Constituição Federal de 1988 condiciona a propriedade ao cumprimento de sua função social, sendo de obrigação de seu proprietário tudo o que ocorrer nos domínios da fazenda. Por isso, o empresário tem o dever de acompanhar com frequência a ação dos funcionários que a administram para verificar se eles estão descumprindo alguma norma da legislação trabalhista, além de orientá-los no sentido de contratar trabalhadores de acordo com as normas estabelecidas pela CLT.

13) Gostaria de alguns números sobre trabalho escravo.
Desde 1995, quando o governo federal criou o sistema público de combate a esse crime, mais de 45 mil pessoas foram libertadas do trabalho escravo no Brasil. No mundo, a estimativa da OIT é que sejam, pelo menos, 20 milhões de escravos. Não há estimativa confiável do número de escravos no país. Na zona rural, as principais vítimas são homens, entre 18 e 44 anos; Na zona urbana, há também uma grande quantidade de sul-americanos, principalmente bolivianos. Nos bordéis, há mais mulheres e crianças nessas condições. Dada a grande quantidade de escravos analfabetos, verifica-se que trabalho escravo também é filho do trabalho infantil. O Maranhão é o principal fornecedor de escravos e o Pará é o principal utilizador. As atividades econômicas em que trabalho escravo mais tem sido encontrado na zona rural são: pecuária bovina, desmatamento, produção de carvão para siderurgia, produção de cana-de-açúcar, de grãos, de algodão, de erva-mate, de pinus. Também há importante incidência em oficinas de costura e em canteiros de obras nas cidades.

14) Todas essas histórias sobre trabalho escravo mancham o nome dos produto brasileiros no exterior.
Pelo contrário, o Brasil é reconhecido internacionalmente pela Organização Internacional do Trabalho, pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, pelo governo dos Estados Unidos, entre outros países, como referência global no combate ao trabalho escravo e na adoção de um conceito de escravidão contemporânea que protege a liberdade e a dignidade do ser humano. Empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, que estão entre as maiores do país, têm relatado que adotar políticas corporativas de combate à escravidão em suas cadeias produtivas tem contribuído com a abertura de novos negócios no exterior. Ou seja, combater esse crime com rigor abre mercados. Afrouxar o conceito, fecharia mercados.

15) Quero votar para defender a dignidade e a liberdade dos trabalhadores. Como eu faço?
Primeiro, vote a favor da PEC 57A/1999, a proposta de emenda constitucional que prevê o confisco de imóveis flagrados com escravos. Então, vote pela inclusão dos elementos “condições degradantes de trabalho” e “jornada exaustiva” no projeto de lei do senador Romero Jucá, que regulamenta a PEC. E vote pelo substitutivo ao projeto do senador Jucá a ser apresentado pelo governo. Dessa forma, os trabalhadores e trabalhadoras do país vão lembrar de você como uma pessoa que contribuiu de forma fundamental para a dignidade desta e das futuras gerações.

Para mais informações sobre a PEC do Trabalho Escravo, acesse trabalhoescravo.org.br.

domingo, 19 de agosto de 2018

OS LIMITES DO VERBO

Despois de um tempo você aprende que a força do verbo não é suficiente para exprimir com precisão e suficiência o sentimento  sentido, vivido, sofrida ou alegremente partilhado e, portanto, conclui que as palavras são obsoletas e qualquer legenda se torna um ingênuo e previsível ato de dizer.
 (Jean Carlos Gonçalves)

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

DRº ISAAC MARTINS - ECOS DO SILÊNCIO NO TEMPO



Como você deseja ser lembrado? Qual é o teu legado?



Essa é uma indagação que poucos param para refletir nos dias atuais, dado o imediatismo e a superficialidade do verdadeiro sentido da vida. Segundo a mitologia grega, certa vez, um jovem se aproximou do guerreiro Aquiles, para avisá-lo de sua convocação pelo rei Agamenon de Esparta, para travar um duelo com o gigante Tessálico Bógris, e, em uma só luta, decidiriam quem subjugaria o reino adversário sem que fosse necessário a morte de milhares de soldados.

Aquiles, questionado pelo mensageiro se, não temia o gigante Tessálico, o guerreiro simplesmente respondeu: “Por isso, seu nome nunca será lembrado.”. Eis aí o ideal grego, o sentido da vida: “Viver para ser lembrado.”, ainda que, na brevidade da vida, o guerreiro não deveria temer a morte, e sim, buscar a glória, por isso, teria que, realizar proezas para que, seu nome fosse lembrado e cantado pela posteridade.

Séculos depois dos tempos homéricos, no Centro-Sul Maranhense, surge um guerreiro, lapidado e obstinado a protagonizar algo inédito e épico no Sertão e no Brasil Império, cujas marcas indeléveis, ecoam há mais de um século. Não sabemos se, Dr Isaac Martins, fora questionado sobre as intempéries que, a vida lhe reservaria, nem se isto, foi alvo de suas preocupações, porém, é inegável que seus feitos são dignos de profunda admiração, tal qual, os grandes heróis da história.

Nascido no município de Loreto-MA, em 1º de abril 1854, Isaac Martins vivera 54 anos de vida intensa, até o seu silêncio eterno em 13 de agosto de 1898. Neste breve intervalo de tempo, sacudiu os Sertões, a Província do Maranhão e o Brasil, assistiram seus esforços em defender os ideais em que acreditava. Forjado no labor das dificuldades cotidianas, tornou-se respeitado e admirado no Maranhão, na segunda metade do século XIX.

Alfabetizado em idade adulta, conseguiu a façanha de cursar Direito em Recife-PE, e antes de concluir o curso, assumiu a promotoria de justiça em Barra do Corda, posteriormente outros cargos na Comarca. Ao lado, de outros baluartes do sertão, Frederico Figueira, Rocha Lima e Dunshee de Abranches, fundou o periódico, O Norte, instrumento na luta abolicionista pela propagação das idéias republicanas, as quais implodiram a monarquia. Sua militância fora ininterrupta. Ocupou e exerceu cargos eletivos importantes, após a instauração da República.
Drª Isaac Martins dos Reis, o líder do republicanos nos sertões maranhenses.
Após 120 anos de seu falecimento, para seguir a “profecia do homem grego”, trazemos à lume, uma página importante da história, que ratifica as referências acerca do Drº Isaac Martins, dada a repercussão nacional de sua morte: A publicação do Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro, capital do país. O texto na íntegra, segue, respeitando o vernáculo da impressão original, como forma de preservar a autenticidade do valioso pergaminho:
DR. ISAAC MARTINS
Telegrammas recebidos hontem recebidos nesta capital confirmam o despacho do nosso serviço especial, noticiando em S. Luiz do Maranhão o falecimento prematuro do ilustre brasileiro dr. Isaac Martins.
Descendente de uma das mais distintas famílias do sertão maranhense, nasceu o finado na cidade de Loreto, onde passou a primeira infância, seguindo mais tarde para Caxias, afim de dedicar-se os estudos secundários.
Cursou depois a Faculdade de Direito, bacharelando-se em 1883, tendo conseguido nos fastos acadêmicos os louros que mais tarde haviam de granjear-lhe a alta influência de que gozava actualmente no seu Estado natal.
Filiado ao partido liberal, ainda estudante salientou-se nas lutas política, então renhidas e sangrentas no sertão maranhense, lutas que ficaram conhecidas como pelos crimes monstruosos do Grajahú e durante as quaes o seu ardor cívico nunca esmoreceu na defesa dos oprimidos, merecendo o respeito e a admiração dos seus próprios adversarios.
Um vez formado, foi nomeado promotor publico de Barra do Corda e, mezes depois, juiz municipal da mesma comarca, onde fixou residencia e dedicou-se aos estudos jurídicos sobre o qual deixa notáveis trabalhos.
Em 1888, depois da abolição, que dia a dia pregava, sustentando formidáveis campanhas que ficaram memoráveis na história do Maranhão, publicou um manisfesto republicano com Rocha Lima e Dunchee de Abranches e com este seguio todo o sertão a serviço da propaganda fazendo meetings , fundando clubes e organizando o partido historico que, mezes mais tarde, empenhava-se aos pleitos eleitorais, A 12 de novembro desse mesmo anno fundava O Norte, o órgão do partido ocupando o lugar de redactor chefe, em que até agora se manteve.
Proclamada a Republica, foi dias depois nomeado juiz de direito, sendo também sendo eleito senador a primeira constituinte maranhense.
Orador brilhante e erudito, os seus discursos foram modelo de sabedoria e moderação; e nos annaes da assembléa maranhense deixaram paginas que hão de ser lidas sempre com grande proveito.
Nas eleições da presente legislatura federal o nome do dr. Isaac Martins foi suffragado por enorme e expressiva votação, não sendo, comtudo, reconhecido na verificação de poderes.
Chefe dos mais prestigiados na politica maranhense, deixa o finado um nome querido e venerado pelos seus próprios adversários que nunca lhe desconheceram as eminentes qualidades do seu rígido caracter e de seus numerosos serviços à causa publica.
É justo, portanto, o luto que neste momento cobre o Maranhão, que acaba de perder um dos mais dilectos e ilustres filhos.
Jornal do Brasil – Edição nº 227
Rio de Janeiro, 15 de agosto de 1898.

As façanhas dos nossos heróis do passado, a exemplo do Drº Isaac Martins, somente terão lugar na memória das futuras gerações se os mais abalizados peritos da história, pesquisadores e memorialistas, lançarem mão do verdadeiro estado da arte do seu ofício. É preciso abnegação para que, faça justiça com os personagens históricos, seu lugar à luz da memória. É inegável que o Drº Isaac Martins dos Reis, o líder dos republicanos nos sertões maranhenses, merece ser objeto de investigação dos historiadores e pesquisadores. Não pode e não deve permanecer no ostracismo da Academia.

Assim sendo, o Blog Ecos de Tuntum apresenta-lhes esse achado histórico que estava coberto de poeira do tempo e do alçapão do esquecimento humano. Agora, o denso véu começar a dissipar...

Que os ecos de sua grandeza sejam objetos de apreço à posteridade.

"Se um dia contarem a minha história.
Que digam que andei com gigantes.
Homens se erguem e caem como trigo, mas esses nomes jamais perecem.
Que digam que vivi na época de Heitor, o domador de cavalos.
Que digam que vivi na época de Aquiles”

Palmas - Tocantins, 15 de agosto de 2018 – Creomildo Cavalhedo Leite.
Tuntum – Maranhão, 15 de agosto de 2018 – Professor Jean Carlos Gonçalves.

sexta-feira, 10 de agosto de 2018

Espelho teu


ESPELHO TEU
Quando tu perceberes
Que a tua felicidade
Não depende de mim...
Que eu posso 
Tão somente refleti-la...
Então, menos sofrerás
E a mim não imputarás
Os teus desígnios,
Os teus caprichos.

(Jean Carlos Gonçalves)

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

O que é Identidade


Identidade é uma daquelas palavras carregadas de significado. Vinda do latim identitate, ela é um substantivo feminino que têm acepções que vão desde o Registro Geral até questões filosóficas importantes que caracterizam a existência humana. Partindo-se do geral para o específico, em primeira instância, identidade refere-se àquilo que é idêntico.

Neste sentido, encaixa-se uma visão matemática, denominada identidade algébrica, na qual a igualdade entre os membros da equação determina a identidade do valor da incógnita. Por exemplo, a expressão xA + xB = x(A +B) configura-se uma identidade, pois, para qualquer valor atribuído a “x”, a igualdade será verdadeira.

Do ponto de vista individual, identidade remete a autenticidade. É o conjunto de elementos que determinam que tal indivíduo é único e irreplicável. Tais elementos (nome, sobrenome, impressão digital, filiação, data de nascimento, impressão digital, características físicas, entre outros) identificam o indivíduo no universo, rotulando-o como um ser excepcional.

Na questão da identificação enquadra-se, também, a identidade no sentido da identificação de pessoas concretizada com o Registro Geral (RG) ou carteira de identidade. O RG é o documento oficial que identifica os cidadãos brasileiros, sendo requisitado por praticamente todas as instituições públicas e privadas para confirmação de identificação.

Na carteira de identidade constam dados como nome completo, nome dos pais, sexo, data de nascimento, data de emissão do documento, impressão digital, assinatura e foto do indivíduo. Além disso, cada RG emitido apresenta um número próprio, usado como forma de representação. Em muitos países da América Latina (por exemplo, Paraguai, Uruguai, Peru, Bolívia Chile, Argentina, Equador, Venezuela e Colômbia), o RG pode ser usado em substituição ao passaporte, o que não ocorre em demais viagens internacionais.
Filosofia e Psicanálise

Por uma abordagem mais científica, a identidade ascende a um nível pessoal, remetendo à consciência que cada indivíduo tem de si mesmo. Nesse sentido, o termo “alter ego”, trabalhado por Sigmund Freud em seus estudos psicanalíticos e cujo significado designa “outro eu”, revela que um ser pode ser feito de várias camadas (ou várias personalidades). Em um nível patológico, uma pessoa que se relaciona com o mundo por meio de várias identidades pode ser acometida de Transtorno Dissociativo de Identidade, embora, para Freud, todos as pessoas estejam sujeitas a manifestações mais tímidas do “alter ego”.

Filosoficamente, ter consciência de si próprio é um elemento fundamental para se diferenciar dos demais. Apesar de existir uma identidade coletiva, que caracteriza a comunidade (ou as comunidades) na qual o indivíduo se insere – vinda da família e do meio cultural, é a consciência da sua originalidade que leva uma pessoa a deixar a sua marca no mundo. Para muitos filósofos, assumir a realidade interior por meio de atitudes e comportamentos cotidianos pode ser o principal caminho para a felicidade, senão o único.
Identidade cultural

Denomina-se identidade cultural o conjunto de elementos que caracteriza uma comunidade ou povo, que vive em sociedade e, junto, desenvolve uma maneira própria de interagir com o mundo, formando tradições ao longo do tempo. Essas formas de interação incluem pratos típicos, danças, festas populares, gírias e sotaques, modos de fazer, trajes, música e instrumentos etc.
Identidade visual

A identidade visual é uma atividade de caracterização de empresas e produtos por meio da arte gráfica. A intenção da estratégia, usada por profissionais de marketing e publicidade, é dar uma “cara” própria ao produto ou empresa, fazendo com que o público consumidor desenvolva uma sensação de simpatia, potencializando-se as chances de venda e posicionamento no mercado.
Identidade falsa e falsa identidade

A expressão identidade falsa é usada principalmente quando se fala em perfis fake nas redes sociais da internet. Geralmente, as pessoas criam contas falsas, com outros nomes, para atrair seguidores ou “espionar” amigos ou namorados. Falsa identidade, por outro lado, é um crime previsto no Código Penal Brasileiro (artigo 307), com pena de prisão de 3 meses a um ano, ou pagamento de multa, considerando que se trate de um crime isolado.

domingo, 29 de julho de 2018

PRECISO DE UMA MÁQUINA DO TEMPO


Jean Carlos Gonçalves 
Preciso...
Preciso de uma máquina
Uma maquina do tempo
Para do tempo não ser refém
E controlar seu movimento

Preciso...
Preciso regressar aos idos
Cortejar seres fantásticos
Enfrentar monstros vorazes
Resgatar heróis silenciados 

Preciso...
Preciso descer às masmorras 
Transpor as ditas, intransponíveis grades 
Romper grilhões degradantes
E ouvir mudas vozes 

Preciso...
Preciso alçar muros
Escalar velhas montanhas
Para de seus cumes mirar
Os adormecidos nos vales sem sombras

Preciso...
Preciso sacudir a poeira 
Das prateleiras da memória
Desnuda-la e nunca estaciona-la
Em qualquer estação inglória

Preciso...
Preciso abrir o álbum da família 
Apreciar cada fotografia
Fazer a leitura das não palavras
Embora com doses de fantasia.

Preciso...
Preciso fazer emergir os aterrados
Inominados protagonistas anônimos 
Para conferir-lhes lugar
Num teatro sem figurantes.

Preciso...
Preciso de revisitar o passado 
Para respirar justiça,
Garantir memória à posteridade
E dar sentido à vida.

Então,
Preciso!
Preciso de uma máquina do tempo!!!

(Jean Carlos Gonçalves)

sábado, 28 de julho de 2018

De Graça Aranha à Tuntum - A chegada.

Por Jean Carlos Gonçalves
O sol ainda a pino, escaldante, fazia rolar pelo o rosto, gotas de suor que atingiam ardentemente os olhos, estado não tão desagradável quanto a dor da partida de horas antes.

Sensação que já havia sido amenizada durante o trajeto da viagem, pela paisagem, muito embora, as "camadas" de ventos quentes na estrada de asfalto cumprissem a missão de não permitir que esquecesse aquela angústia da partida.

Passavam das 14:00 h, quando a D-20 do amigo Crézio, como numa espécie de carro batedor, adentrara a cidade, orientando sobre o percurso para o caminhão da mudança.

Pelas ruas, os transeuntes e residentes sentados às suas portas observavam atentamente, na proporção da lentidão dos veículos, como em câmera lenta, e mesmo sem nenhuma palavra, não foi difícil perceber a curiosidade ou mesmo a perplexidade devido a nossa chegada.

Não porque era raro assistirem a uma mudança, ao contrário, em 1987 era comum se deparar com carradas de mudanças pelas ruas da cidade. Pois devido a construção da Barragem do Rio Flores, centenas de famílias atingidas por suas águas foram obrigados a deixar as povoações do norte do município, especialmente, do Alto do Coco, até então, o maior povoado de Tuntum-MA (mais de 2 mil habitantes), e, que ficou reduzido há uma dezena de habitações. A admiração dos espectadores de nossa chegada consistia justamente por fazermos o sentido contrário, pois enquanto muitas famílias chegaram à cidade vindas da zona rural ou partiam para outros municípios, nós chegávamos para morar, em movimento oposto.

Quando chegamos à rua Eugênio Barros e os veículos estacionaram em frente ao casebre de n° 262, meu tio Elesbão que havia chegado há décadas, estava nos aguardando, além de alguns parentes e dos novos vizinhos, num evidente gesto de boas-vindas, expressos em palavras, abraços e afagos. Como foi boa a acolhida...!!! Tanto que fez esquecer momentaneamente, a tristeza da partida de Graça Aranha. 

Enquanto o pessoal descarregava os últimos móveis, meu pai chamou o Crézio e o seu Zé Gomes, nossos ex-vizinhos de Graça Aranha, proprietários dos carros e muito amigos, para pagar-lhes o transporte da mudança. Os mesmos responderam-lhe:

"O Sr° não nos deve nada, Seu Martinho. Basta a nossa indesejada separação".

Lembro que tais palavras levaram meu velho pai às lágrimas, e causando em todos um profundo silêncio que, posteriormente, fora interrompido com cumprimentos de despedida, momento em que alguns sorrisos contagiaram o ambiente.

Entretanto, logo uma tensão toma conta de meus pais: A casa estava sem instalação elétrica e nas torneiras, nenhuma gota d'água. A questão da eletricidade, fora logo resolvida. Meu pai trouxe de Graça Aranha dois pedreiros. Um deles, o Jó, era polivalente, de tudo sabia um pouco e antes do anoitecer todos os cômodos da casa contava com luz elétrica.

Quanto a questão da água, logo nos apresentaram a Mucuíba, uma fonte d'água natural localizada no final da rua 12 de setembro, no sentido do Centro para bairro Vila Mata, e que socorria a população dos arredores e da maioria do Tuntum de Baixo (O Centro). Numa época que a falta de abastecimento de água potável nas residências da cidade eram mais constantes e a Mucuíba fornecia água para praticamente tudo: cozinhar, lavar, tomar banho e, no nosso caso, para os pedreiros reformarem a casa.

Era uma penitência, uma romaria, uma cruzada em busca do substancial maná: adultos, homens, mulheres, idosos e crianças disputavam os espaços e ao redor da fonte uma verdadeira guerra de baldes e outros recipientes. Muitas vezes caiam ao fundo e tínhamos que descer alguns metros para recuperá-los. Eu mesmo desci diversas vezes, pois contava apenas 8 anos e era magricelo, o que facilitava a descida ao fundo do manancial. Como prêmio enchiam meu pequeno balde, que alçava à cabeça e saia cambaleante para subir aquela inclinada ladeira.

Lata d'água na cabeça. Carlos Alberto Marques - COMLURB
Técnica: Lápis sobre papel com aguada de café
Dimensões : 29,7 x 42 cm

E nas idas e vindas, subidas e descidas daquela memorável ladeira, durante e após cada missão cumprida, batia a tristeza por lembrar da terrinha natal, fartura d'água, das mangueiras e bananais...

Dali, entretanto, do alto do aclive, tal qual o marujo posto na cesta da gávea (no caralho*) como castigo, que avistei o riacho e, à beira, um campinho de areia...

E a partir daí...

Bebi da água da Mucuíba, 
Dela carreguei incontáveis baldes, 
Banhei na cacimba da Purdência, 
Joguei bola na beira do riacho, 
Dele fiz meu mar de inocência
Onde realizei épicas aventuras 
Que hoje de mim faz refém
Das mais desejadas lembranças.

(Jean Carlos Gonçalves)


Caralho* - Local destinado aos marinheiros nas antigas naus no tempo de cabral. Era um local no alto do mastro do navio onde o marinheiro poderia observar se havia terra à vista. Local de castigo de marujos indisciplinados. Daí a expressão"vá pra casa do carálho!".
Pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros das caravelas, de onde os vigias analisavam o horizonte em busca de inimigos ou sinais de terra.

sábado, 23 de junho de 2018

COMO DEVEMOS AGIR - ÉTICA E MORAL - TEORIAS ÉTICAS


1) O que é ética? Em que condições uma pessoa pode assumir a responsabilidade moral pelas ações que praticou? (p.230) 

Ética é o campo da filosofia que estuda a moralidade, na sua natureza e sua origem e seus problemas. Enquanto a moral se apresenta como um conjunto de prescrições, a ética busca empreender uma reflexão filosófica sobre a prática da moral. O sujeito da moral é responsável por suas ações quando age de forma livre e consciente. 

2) O que é egoísmo? A atitude egoísta é sempre imoral? O que é altruísmo? Para você, o altruísmo é uma tendência natural do ser humano ou só agimos em prol dos outros por causas das convenções sociais? Justifique sua opinião. (p.235) 

O egoísmo é uma atitude voltada para os interesses próprios, com pouca ou nenhuma atenção às necessidades alheias. A ação egoísta não é imoral em si mesma, mas se torna imoral quando se choca com valores morais como o direito à vida, o respeito a diferentes culturas, entre outros. Enquanto que o altruísmo pode ser definido como a prática de uma atitude que tem como motivação a realizações dos alheios. Pessoal. 

3) Como se caracterizam as teorias das virtudes? Qual delas você considera a mais importante? Por quê? (p.240) 

As teorias éticas das virtudes enfatizam a formação do caráter por meio da aquisição de bons hábitos. Pessoal. 

4) O que são os deveres? De que os modo os deveres se relacionam aos direitos? Qual é o fundamento da lei moral de Kant? (p.243) 

Os deveres são obrigações morais que devem ser seguidas por si mesmas, e não em função de suas consequências. Na teoria dos direitos e deveres, cada direito corresponde a um dever, em um sistema que deve tender ao equilíbrio entre os direitos e deveres e partindo do pressuposto de que existem direitos humanos dados pela natureza. Para Kant, o fundamento da lei moral é a razão e se expressa por meio do imperativo categórico. 

5) Em que consiste o princípio da utilidade? Qual é a diferença entre as concepções de moralidade de Benthan e Mill? (p.245) 

Para utilitarismo, a utilidade é a propriedade que propicia o maior benefício e o mínimo de prejuízo para o maior número de pessoas. A abordagem utilitarista de Benthan é de caráter quantitativo, enfatizando a utilidade da ação, enquanto a de Mill incorpora um aspecto qualitativo, enfatizando a utilidade das normas morais. 

6) O que são dilemas éticos? Mencione exemplos que você conheça ou possa imaginar. (p. 246) 

Os dilemas éticos envolvem geralmente situações de pacientes terminais que não tem mais chances médicas de recuperação e colocam questões como “Não seria melhor que o paciente morresse para aliviar o seu sofrimento e o da família?” ou Não seria melhor usar os recursos hospitalares com pacientes com chances reais de recuperação em vez de prolongar uma vida de sofrimento?”. Pelas entrevistas, pode-se perceber que as opiniões dos profissionais de sáude são diversas e há casos em que eles mesmos não sabem o que pensar ou fazer. 

7) O que é relativismo moral? Em sua opinião, existem preceitos morais universais ou são todos determinados por uma cultura e particular? Justifique. (p.248) 

Relativismo moral é uma concepção segundo a qual os valores morais são relativos, isto é, variam de uma cultura para a outra. Pessoal.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Direitos Humanos ou Direito dos Manos?


Quando adentramos numa disciplina de Direitos Humanos a primeira coisa que nos confronta é o senso comum de que o dito “Direitos Humanos” só serve para proteger bandido.

Mas, não é bem assim.

Os Direitos Humanos são direitos positivados e inalienáveis que se aplicam a todos os seres humanos pelo simples fato de serem humanos, pelo simples fato de existirem.

O problema atual da segurança pública do Brasil não guarda nenhuma relação com os Direitos Humanos, não são os direitos positivados causador da péssima eficiência do serviço público de segurança do país. O péssimo serviço prestado, pelas policias, está intimamente ligado com a má gestão dos políticos corruptos; e não com os direitos conquistados ao longo dos séculos a custa de sangue de inocentes.

Os infinitos recursos protelatórios no Direito Penal estão ligados com a má vontade dos deputados e senadores em modernizar o código penal, talvez com medo de serem pegos pelas próprias mudanças, afinal, grande parte dos congressistas estão envolvidos em escândalos e serão julgados pelo código penal que é anterior a Magna Carta, então o ideal é ser julgado por um código penal ineficiente e, com um código de processo penal que admita recursos intermináveis. Os Direitos Humanos não garante a impunidade como via para solucionar os problemas, pelo contrário, nos direitos positivados encontramos o direito a um processo célere que garanta ao acusado o amplo direito de defesa e um juízo imparcial.

Não podemos nos esquecer que os Direitos Humanos também protegem o direito à vida, à liberdade, à moradia, o direito de ir e vir, o direito de um juízo imparcial e etc.

Será mesmo que o problema são os Direitos Humanos? Será mesmo que o problema são os direitos positivados?

Está na hora de acabar com a falácia de que os Direitos Humanos só protege bandido.

Avancemos pela história e mudemos o rumo do nosso país.

FONTE: https://juridicocerto.com/p/ricarthe-oliveira1/artigos/direitos-humanos-ou-direito-dos-manos-4193

Direitos Humanos e Polícia - Perguntas e Respostas

1. O que são direitos humanos?

Direitos humanos derivam da dignidade e valor inerente à pessoa humana, e esses são universais, inalienáveis e igualitários. Isto significa que são inerentes a cada ser humano, não podem ser tirados ou alienados por qualquer pessoa; e todos têm os direitos humanos em igual medida – independente do critério de raça, cor, sexo, idioma, religião, política ou outro tipo de opinião, nacionalidade ou origem social, propriedades, nascimento ou outro status qualquer.

Eles são melhor entendidos como aqueles direitos constantes nos instrumentos internacionais: Declaração Universal dos Direitos Humanos, O Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, tratados regionais de direitos humanos, e instrumentos específicos lidando com aspectos da proteção dos direitos humanos como, por exemplo, a proibição da tortura.

2. Se os direitos humanos são inalienáveis e não podem ser tirados de nenhuma pessoa, isto significa que eles nunca podem ser limitados ou negados?

Não, isto significa que quando um direito é expresso por um código ou instrumento legal, os limites ou fronteiras devem ser definidos. Por exemplo, o direito à liberdade da pessoa pode ser limitado pelo exercício dos poderes legais de detenção ou prisão.

3. Você se refere a Instrumentos Internacionais, a Declaração, Pactos e Tratados. Qual é diferença entre esses?

“Instrumentos Internacionais” neste contexto significa todos os textos que englobam os padrões internacionais de direitos humanos. Alguns desses textos são tratados que obrigam os Estados-Parte que os ratificaram. Esses tratados são chamados de Pactos ou Convenções. A Carta das Nações Unidas também é um tratado que obriga os Estados-Parte.

A Declaração, referindo-se à Declaração Universal dos Direitos Humanos, foi adotada pela resolução 217 A(111) de 10 de dezembro de 1948 da Assembleia Geral das Nações Unidas. Não é um tratado que obrigue os Estados, mas há discussões entre juristas internacionais para que a extensão de seu conteúdo, total ou parcial, pode ser legalmente obrigatório aos Estados sob o aspecto do direito consuetudinário internacional (costumes). Algumas declarações ou resoluções, ou partes dessas, podem eventualmente se tornar mandatórias sob o aspecto da lei internacional, se as suas provisões demonstrarem que se tornaram prática habitual aceita pelos Estados. Se as provisões alcançarem esse status, podemos dizer que se tornaram direito consuetudinário internacional.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos e os dois Pactos dela decorrentes têm aplicação global. Os Pactos são obrigatórios aos Estados que os ratificaram, mas também existem tratados regionais tais como a Carta Africana de Direitos Humanos; a Convenção Americana de Direitos Humanos, e a Convenção Europeia de Direitos Humanos.

Outros instrumentos internacionais incluem códigos e princípios. Esses textos são adotados por organismos internacionais como a Assembleia Geral das Nações Unidas. Esses instrumentos não são obrigatórios por si só, mas eles reiteram e reforçam as provisões dos tratados, assistem e encorajam o cumprimento daquelas provisões estabelecendo padrões detalhados para aquela finalidade.

4. Os títulos dos dois Pactos Internacionais referem-se a dois tipos diferentes de direitos humanos. São eles igualmente importantes e relevantes para o trabalho policial?

A distinção surgiu, em primeiro lugar, pelo modo que os direitos neles constantes foram abordados na teoria. Em primeiro lugar, os direitos humanos foram considerados como clamor pela não intervenção dos governos na vida dos cidadãos. A primeira geração dos direitos veio a ser conhecida como direitos civis e políticos. Estes incluem o direito à vida, o direito à liberdade e segurança da pessoa; a proibição da tortura e tratamentos degradantes; direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; o direito à liberdade de opinião e expressão; o direito à liberdade de reunião pacífica e de livre associação. Pode-se facilmente verificar que direitos dessa natureza afetam diretamente e são afetados pelo trabalho policial.

Em seguida foi solicitado uma participação e intervenção positiva dos governos para promover a justiça social, que também deveriam ser considerados como direitos humanos. Esta segunda geração de direitos veio a ser conhecida como os direitos econômicos, sociais e culturais. Estes incluem o direito à seguridade social; direito ao trabalho; direito à educação; o direito à participação na vida cultural de sua comunidade. A relação entre o trabalho policial e esta categoria de direito é menos óbvia, mas existe.


Essas duas gerações de direitos são consideradas como indivisíveis e interdependentes de modo que se considera que o gozo de uma categoria de direitos está diretamente ligada ao gozo da outra. Neste sentido não podemos considerar que um direito seja mais importante que outro, apesar de, em certas circunstâncias, alguns direitos adquirem maior significado específico.

Os direitos em ambas categorias apresentadas são conhecidos como direitos individuais, pois cada indivíduo deve poder usufruí-los. Uma terceira geração de direitos conhecidos como direitos coletivos são agora reconhecidos, e isto incluiria, por exemplo, o direito ao desenvolvimento.

5. Uma das razões que policiais são tão reservados a respeito do conceito de direitos humanos é que, quando se fala em direitos humanos parece que estão mais voltados à proteção dos criminosos que às vítimas. Você considera que isto reduz o valor dos direitos humanos?

Não. A razão principal dos direitos humanos é lidar com um tipo específico de violação – o abuso de poder pelo Estado. Os padrões internacionais de direitos humanos têm o objetivo de prevenir que as pessoas se tornem vítimas desse abuso, assegurá-las e protegê-las caso isto aconteça. Algumas violações de direitos humanos são atos criminosos por si só – tortura, por exemplo, e execuções ilegais por funcionários do Estado.

Os criminosos também têm direitos humanos, por exemplo, têm direito a um julgamento justo e a um tratamento humano quando detidos. Uma vez sentenciados por uma corte de justiça pelo cometimento de uma ofensa criminal, eles perderão o direito à liberdade durante o tempo de cumprimento da sentença.


No que se refere aos policiais, estes devem entender que enquanto estiverem investigando um crime, estão lidando com suspeitos e não com pessoas que foram condenadas pelo cometimento de um ato criminoso (que está sendo investigado). Apesar de um policial acreditar que a pessoa realmente cometeu o crime, somente a justiça poderá considerar a pessoa culpada. Este é um elemento essencial para um julgamento justo, prevenindo que pessoas inocentes sejam condenadas por crimes que não tenham cometido.

Formas inadequadas de se fazer justiça, levando à condenação pessoas inocentes, (devido ao modo que a polícia desrespeita os direitos humanos), leva um descrédito ao trabalho policial e ao sistema judicial como um todo. A consequência é que as pessoas param de cooperar com a polícia, reduzindo a sua eficiência.

No que concerne às vítimas de atos criminosos, existe um instrumento internacional que estabelece padrões para o tratamento com essas pessoas – Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder.

6. Mas o que dizer das violações de direitos humanos cometidos por criminosos e terroristas?

A violação de direitos humanos somente pode ser cometida por uma pessoa com a autoridade e poder conferida pelo Estado e a exercê-la em seu nome. Nenhum criminoso ou terrorista tem essa dignidade ou esse poder. Quando criminosos ou terroristas ferem ou matam pessoas eles cometem atos criminosos, mas não cometem violações de direitos humanos. Isto não reduz o mal que fizeram e devem ser punidos pela lei pelos crimes cometidos.

Este ponto também pode ser ilustrado considerando-se a ação de um policial. Se este policial, durante seu trabalho, agride fisicamente um suspeito durante uma entrevista ou depoimento, intimidando essa pessoa a confessar um crime, essa ação seria considerada criminosa (lesão corporal ou tortura), mas também seria uma violação aos direitos humanos (proibição de tratamento degradante ou tortura). Mas, se por outro lado um policial não estando de serviço, agindo por conta própria venha a agredir alguém, esta ação seria criminosa, mas não uma violação dos direitos humanos.


Em ambos os casos apresentados o policial deverá ser punido pela lei criminal de seu país, mas, no primeiro exemplo, a vítima tem o direito de proteção e indenização do Estado.

Com respeito à prevenção contra tortura, identificação e punição das pessoas que a cometeram, os instrumentos internacionais estenderam a noção de responsabilidade para esta violação específica dos direitos humanos.

7. Assim sendo, em relação aos direitos humanos, policiais são considerados como delinquentes?

Não. A relação entre polícia e direitos humanos está centrada nas noções de proteção e respeito, e pode ser uma relação muito positiva.

De fato é função da polícia a proteção dos direitos humanos. Ela faz isso de maneira genérica, mantendo a ordem social, de modo que todos os direitos humanos, de todas as categorias possam ser gozados. Quando há uma quebra na ordem social, a capacidade e habilidade do Estado em promover e proteger os direitos humanos são consideravelmente diminuídos ou destruídos.

Ainda, é parcialmente por meio da atividade policial que o Estado atinge suas obrigações legais de proteger alguns direitos humanos específicos – o direito à vida, por exemplo.

Considerando o respeito, policiais devem respeitar os direitos humanos no desenvolvimento de suas atividades profissionais. Em outras palavras, considerando que é função da polícia a proteção dos direitos humanos, o requisito de respeito a esses direitos afeta diretamente o modo que a polícia desempenha todas as suas funções.

Isto também é um relacionamento positivo para o requisito de proteção aos direitos humanos, que estejam intimamente ligados ao desempenho das funções policiais. Por exemplo: direitos humanos são protegidos por lei, a polícia aplica a lei (faz cumprir a lei) com o objetivo de prevenir e detectar o crime, manter a ordem social e proteger os direitos humanos. Visto desse modo, a atividade de polícia consiste em desempenhar funções policiais, e ao mesmo tempo proteger os direitos humanos. Violar os direitos humanos, desrespeitar as normas legais como propósito de aplicar a lei não é considerado uma prática policial eficiente – apesar de algumas vezes se atingirem os resultados desejados. Quando a polícia viola a lei com o intuito de aplicá-la, não está reduzindo a criminalidade, está somando a ela.


O relacionamento entre polícia e direitos humanos é negativa, sendo os policiais vistos como delinquentes, quando esses mesmos direitos não são respeitados. Quando isso acontece, demonstra que o trabalho policial efetivo não está sendo desempenhado.

8. O cumprimento às proibições e limitações previstas nos instrumentos internacionais é um dos elementos do trabalho policial eficaz. Talvez o tratamento do tema seria menos crítico se a polícia tivesse uma visão mais positiva de direitos humanos e se os instrumentos legais expressassem mais que somente uma série de limitações e proibições na ação policial.

Os princípios que fundamentam os direitos humanos – respeito pela dignidade da pessoa humana, universalidade e inalienabilidade de direitos – não são proibições ou limitações, são ideais humanitários comuns apoiados no império da lei. Esses providenciam uma base muito positiva entre aqueles que exercem o poder estatal e aqueles em favor de quem é exercido – indivíduos e grupos na sociedade.

Os direitos que derivam desses princípios fornecem mais regras de comportamento do que de relacionamento. No que concerne à atividade policial, esses são requisitos positivos – respeitar o direito à liberdade e segurança da pessoa, ou conduzir investigações de um crime de modo que o direito a um julgamento justo seja assegurado.

Os códigos e princípios internacionais que referem à atividade policial providenciam uma orientação detalhada e de maneira positiva para diversas situações. Por exemplo, o Código de Conduta para os funcionários responsáveis pela aplicação da lei, das Nações Unidas abrange normas gerais e específicas de comportamento na matérias como uso de força (art. 3º), confidencialidade (art. 4º), proteção a pessoas detidas (art. 5º e 6º), e respostas a comportamento não desejável por colegas de profissão (art. 8º). O art. 1º requer altos padrões de responsabilidade e competência profissional. A resolução das Nações Unidas que adotou o Código (34/169 de 17 de dezembro de 1979) requer inter alia, que toda organização de aplicação da lei seja representante da sua comunidade no seu conjunto, bem como responder às suas necessidades e ser responsável perante ela. Esta é uma declaração muito positiva da natureza da função policial e o relacionamento das organizações policiais e as comunidades a que elas servem.

Os Princípios básicos sobre a utilização da força e de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei é outro instrumento. Seus 26 princípios propiciam exemplos práticos e detalhados para melhor prática no uso de força e armas de fogo pela polícia. Esses princípios expressam padrões positivos nas matérias como a criação de regras e orientações nacionais para o uso de força e armas de fogo (Princípio 1); o desenvolvimento de leque de meios tão amplo quanto possível e habilitar os funcionários responsáveis pela aplicação da lei com diversos tipos de armas e munições que permita o uso diferenciado da força e armas de fogo e adoção de material defensivo (Princípio 2); a circunstância na qual armas de fogo podem ser utilizadas contra pessoas (Princípio 9); treinamento de policiais (Princípio 20); aconselhamento contra stress para policiais; e responsabilidade individual de policiais e de seus comandantes (Princípios 24 – 26).

9. Policiais são naturalmente interessados na maneira que a lei é aplicada. Que medidas e sistemas existem para assegurar o cumprimento das leis internacionais de direitos humanos?

Em 17 de julho de 1998, a comunidade internacional decidiu, durante uma conferência diplomática, pela criação de um tribunal permanente – a Corte Penal Internacional – encarregada de julgar os crimes de guerra, crimes de genocídio, crimes contra a humanidade e etc.

Os vários mecanismos existentes atualmente para assegurar o cumprimento das leis internacionais de direitos humanos estão diretamente dirigidas a encorajar os Estados a criar e sustentar os arranjos legais de modo a implementar suas obrigações legais internacionais de proteger os direitos humanos. Estados são encorajados a cumprirem sua própria legislação nacional pelos meios disponíveis em sua administração quando existem violações de direitos humanos, protegendo compensando as vítimas.


Os mecanismos internacionais são de duas categorias – 1) corpos de princípios e procedimentos dentro do sistema das Nações Unidas(ONU), e 2) procedimentos baseados em tratados e procedimentos. No sistema da ONU, o organismo principal é a Comissão de Direitos Humanos, que é composta de 53 representantes dos Estados-Membros. A Comissão faz estudos, prepara recomendações e esboça instrumentos internacionais relativos a direitos humanos. Também desenvolve ações especiais designadas pela Assembleia Geral, e pelo Conselho Econômico e Social da ONU. Estas ações incluem a investigação de alegações de violações de direitos humanos e suas respectivas comunicações.

Ainda existem procedimentos especiais em relação à ONU. Pode consistir em uma pessoa “Special Rapporteur” ou pode consistir em um Grupo de Trabalho. Esses procedimentos especiais são de duas categorias: 1) procedimentos temáticos e, 2)procedimentos específicos a países.

Os procedimentos temáticos se dirigem a um tipo específico de violações. Por exemplo, em 1988 a comissão de direitos humanos estabeleceu um Grupo de Trabalho sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários com a atribuição de estudar o fenômeno. Foi indicado um “Special Rapporteur” para execuções extrajudiciais, um para Tortura, um para Intolerância Religiosa, e um Grupo de Trabalho para Detenção Arbitrária.

Os procedimentos específicos para países tratam das situações de direitos humanos em um país ou território em particular. Isso significa um grande número de países em todas as regiões do mundo.

Há ainda várias formas de procedimentos baseados em Tratados. Por exemplo, o Comitê de Direitos Humanos estabeleceu na Parte IV do Pacto Internacional pelos direitos civis e políticos, duas funções principais – supervisão e aplicação. Supervisão é conduzida por meio de relatórios, onde os países ratificadores do Pacto submetem relatórios periódicos sobre as medidas que adotaram e dão efetividade aos direitos reconhecidos no Tratado e progresso alcançado na fruição desses direitos. Aplicação envolve comunicação (denúncias) por indivíduos que alegam terem sofrido violações de direitos protegidos pelo Pacto, e ainda denúncias de Estados contra outros no que concerne a sua conduta.

Um Comitê contra a Tortura foi estabelecido pela Convenção contra Tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos e degradantes. Este Comitê recebe constantes relatórios de Estados ratificadores, examina a informação que aparenta conter indicações fundamentadas que a Tortura é sistematicamente utilizada naquele Estado.

Cada um dos 03 Tratados Regionais estabeleceram procedimentos que asseguram o cumprimento de suas provisões. Assim existe uma Comissão Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos; uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos e uma Corte Interamericana de Direitos Humanos, e uma Corte Europeia de Direitos Humanos.

Este são apenas alguns exemplos que existem de mecanismos de aplicação das normas. Outros ainda existem dentro do sistema das Nações Unidas e estabelecidos por meio de tratados.

O autor: RALPH CRAWSHAW é ex-policial britânico e agora do Centro de Direitos Humanos, trabalhando no campo de direitos humanos e trabalho policial.

'LIMITE DA PROPRIEDADE DA TERRA NO BRASIL NÃO ACABARIA COM AS GRANDES PROPRIEDADES'

O geógrafo Paulo Alentejano, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), conta nesta entrevista como o limite do tamanho da propriedade rural no Brasil pode reduzir a desigualdade no campo. Ao contrário do que os opositores da medida fazem parecer, ele explica por que a proposta não é radical e como outros países já limitaram o tamanho das fazendas, inclusive implementando reformas agrárias. Segundo o pesquisador, nenhum projeto de reforma agrária foi colocado em prática em toda a história do Brasil.

Qual é o quadro brasileiro em termos de concentração fundiária?
A concentração da propriedade da terra no Brasil é algo não apenas persistente como crescente. O Brasil está entre os países com maior grau de concentração, seja pelos dados do IBGE, seja pelos dados do Incra. O IBGE trabalha com a categoria de ‘estabelecimentos agropecuários’, que leva em consideração a unidade gestão, enquanto o Incra leva em consideração o documento de propriedade, trabalhando com imóveis. Pelo IBGE, a comparação é que a parcela dos maiores estabelecimentos, com mais de mil hectares, que são menos de 1% do total, tem 44% das terras, enquanto os menores estabelecimentos, que são 47% do total, somam apenas 2,36%. Ao se tomar como base os dados do Incra de imóveis rurais no cadastro de 2003, isso não é muito diferente – a grande maioria dos imóveis tem menos de 10 hectares, mas ocupam a menor área. Pelo Incra os dados mostram que propriedades com menos de 10 hectares são 31,8% do total e ocupam só 1,8% das terras agrícolas. Os imóveis com mais de cinco mil hectares são apenas 0,2% do total e tem 13% das terras.

E historicamente, como o país chegou a esta situação?
Esta história se inicia sem dúvida já com o processo da colonização, quando, através das chamadas Sesmarias, se distribui o controle da terra para poucos amigos do rei de Portugal. Eles passam a ter o direito de explorar a terra, mas também a responsabilidade sobre o controle político do território, em um sistema que articula economia e política. Há a exploração da terra, via exploração do trabalho escravo, e também controle político sobre o território, para que outras potências estrangeiras não viessem se apoderar disso. Então, há já no início da colonização o estabelecimento do latifúndio, que se reafirma em 1850 com a Lei de Terras. A lei transforma a terra numa mercadoria e, ao dizer que as pessoas só podem ter acesso à terra na medida em que têm recursos para comprá-la, alija os escravos que estão em processo de libertação, os imigrantes que vão vir para substituir os escravos, os homens livres e pobres. Mantém-se o monopólio da terra e a concentração após a Lei de Terras e ao longo de toda a história do século XX. E agora, no século XXI, as sucessivas tentativas de realizar a reforma agrária no Brasil foram barradas pelo poder político do latifúndio. Isso, inclusive, se acentua nos últimos anos em função do caráter da modernização que se deu na agricultura brasileira a partir dos anos 1970. Essa modernização vem reforçar a concentração, na medida em que aumenta a capacidade produtiva com a expulsão cada vez maior de trabalhadores da terra. Portanto, há uma persistência histórica da concentração da terra no Brasil que se refaz e se reforça até o momento pela incapacidade de os movimentos sociais transporem essas barreiras políticas e de modernização técnica.

Você considera que o Brasil em algum momento tentou ou colocou em prática algum projeto de reforma agrária?
O momento que chegou mais próximo disso foi antes do golpe [civil-militar] de 1964. Naquele momento existia uma mobilização muito forte no campo, as Ligas Camponesas, a União dos Trabalhadores da Agricultura, o Movimento dos Agricultores Sem Terra (Máster), havia uma diversidade grande de movimentos sociais rurais naquele momento, com uma articulação importante naquela história. E havia também por parte do governo João Goulart uma aposta na possibilidade da reforma agrária como parte das reformas de base. Entretanto, as forças conservadoras mais uma vez acabaram por triunfar. João Goulart anunciou em comício na Central do Brasil, no dia 13 de março de 1964, a desapropriação das terras localizadas nas imediações das rodovias e ferrovias federais. Menos de um mês depois houve o golpe militar, em 1º de abril, e uma das razões fundamentais foi justamente a reação à proposta de reforma agrária no Brasil. De lá para cá isso se repetiu muitas vezes: quando há uma força maior dos movimentos, há regressão do processo pela reação conservadora. Isso aconteceu em 1964, aconteceu com a Nova República, quando Tancredo Neves e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil construíram o primeiro plano nacional de reforma agrária e a UDR [União Democrática Ruralista] reagiu fortemente, esvaziando o plano, e, depois, na Constituição de 1988, quando a luta pela reforma agrária também foi esvaziada. Imaginava-se que o governo Lula iria efetivar a reforma agrária, construiu-se a perspectiva do segundo plano nacional de reforma agrária e, mais uma vez, a força do agronegócio se contrapôs com a justificativa de que tem uma importância enorme para a balança comercial. E aí se desconstruiu novamente a possibilidade da reforma. Então, reafirmou-se a todo momento este esvaziamento da reforma agrária. Quando os movimentos colocam na pauta as forças conservadoras se rearticulam e impedem que ela se efetive.

E há experiências em outras partes do mundo que tenham implementado propostas de reforma agrária que deram certo?
Podemos falar isso em movimentos que foram conduzidos na lógica da modernização capitalista, como é o caso dos Estados Unidos, que impuseram o processo na Ásia no final da Segunda Guerra Mundial - inclusive estabelecendo limite para o tamanho da propriedade da terra no Japão, na Coréia do Sul e em Taiwan. Na América Latina houve processos diferenciados e amplos de reforma agrária, alguns a partir da base, da mobilização popular - o caso do México é o mais emblemático, mas há também o da Nicarágua - e outras propostas de natureza reformista, como no Peru, no Chile ena Bolívia, em vários momentos históricos. A reforma agrária surge no mundo como uma medida de desenvolvimento do capitalismo e em outros casos foi associada a processos revolucionários, que é o caso da União Soviética, da China, de Cuba e outras situações sui generis. Então, a reforma agrária é algo que ao longo dos últimos 200 anos ocorre muitas vezes, em muitos países, com muitos sentidos e situações diferenciadas.Não há uma regra única para esse processo.

A reforma agrária não é então algo necessariamente radical, como fazem parecer ser?
Não, em alguns casos ela foi exatamente um processo de modernização capitalista. Aliás, na década de 1960, o governo Kennedy, nos Estados Unidos, formula na chamada Aliança para o Progresso a ideia de que era preciso fazer reforma agrária na América Latina para conter processos mais amplos à semelhança do de Cuba. Então, inclusive, há uma construção da reforma agrária como uma medida anti-revolucionária. No Brasil, nada disso se concretizou, nem sequer reformas agrárias tímidas pontuais, anti-socialistas ou anti-revolucionárias. Na verdade sempre foram obstaculizadas pelas forças do latifúndio que não abrem mão do monopólio da terra. A terra tem se constituído como um bem econômico, que significa poder político e que dá acesso a fundos públicos, este é um outro elemento fundamental. A terra no Brasil é um dos mecanismos de acesso a financiamento e isso é uma estratégia que faz com que grandes grupos econômicos sejam grandes proprietários de terra, embora não sejam exatamente grandes produtores. Hoje no Pará, por exemplo, o grupo Oportunity do Daniel Dantas tem enormes extensões de terra para pretensos projetos agropecuários como lavagem de dinheiro, evasão de impostos e uma série de mecanismos que existem também do ponto de vista financeiro e que justificam o controle sobre a terra.

Essa nova configuração que você descreve com a presença de grandes corporações também proprietárias de terra muda a correlação de forças no campo?
Sem dúvida. Embora o latifúndio seja persistente no Brasil, ele tem caras diferentes ao longo do tempo. O latifúndio já foi a cara do velho coronel das oligarquias agrárias, do senhor de engenho, e hoje o latifúndio, embora exista também assim, tem fundamentalmente a cara de grandes empresas capitalistas, grandes monopólios financeiros, grandes empresas transnacionais e grandes grupos empresariais brasileiros também, que, inclusive, se utilizam de instrumentos como grilagens de terras para se apropriar das terras públicas, e se utilizam de trabalho escravo ainda hoje. No ano passado, o Rio de Janeiro foi o estado com o maior índice de trabalho escravo no Brasil em função de casos identificados na usina Santa Cruz, que é arrendada pelo grupo J. Pessoa, o maior grupo usineiro do Brasil. Então, não estamos falando de um coronel atrasado no sertão, mas de grandes grupos empresariais, que trabalham com trabalho escravo aqui e altíssima tecnologia lá. O capital hoje articula as formas mais desenvolvidas possíveis tecnologicamente com as formas mais arcaicas de exploração do trabalho, não há contradições desse ponto de vista. Então, são interesses extremamente poderosos que existem hoje contra qualquer tipo de reforma agrária, e por que isso? Porque mesmo o agronegócio dito altamente produtivo necessita permanentemente de terras novas para sua expansão. Até porque desgasta profundamente o solo e, desgastando o solo, precisa de novas terras para se expandir, e se não tiver estoque de terras improdutivas não tem para onde avançar e não tem com se recompor. Por isso há uma necessidade desses setores, mesmo os ditos mais desenvolvidos da agricultura brasileira, de manterem estoques de terras paradas e situações arcaicas de produção. Por que os empresários não aceitam a atualização dos índices de produtividade para desapropriação de terras para reforma agrária, que são de 1975? Porque necessitam permanecer com estoque de terra parada para que ele possa lançar mão em algum momento.

Esta proposta de atualização dos índices de produtividade também foi bastante combatida. Como está esta discussão?
A lei agrária de 1993 estabelece que por decreto interministerial os índices serão atualizados de tempos em tempos. E quando a lei estipulou os índices, o fez com base em dados super atrasados, do censo de 1975. Desde o primeiro governo Lula existe uma proposta de atualização dos índices de produtividade feita pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que está na mesa do gabinete civil da presidência para que seja assinado. A proposta nunca foi efetivada porque tem que ser um decreto interministerial e tem que ter assinatura do MDA e também do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que é o ministério que representa os interesses do agronegócio, do latifúndio, da grande propriedade da terra no Brasil. Os sucessivos ministros da agricultura sempre negaram acordo para atualização dos índices de produtividade e a força política deles sempre foi a bancada ruralista, que sempre disse que se houvesse atualização dos índices de produtividade o governo Lula perderia qualquer apoio deles. Então, há um processo claro de pressão política da bancada ruralista, que beira a chantagem, para a não atualização dos índices de produtividade e o governo Lula sucumbiu à força política destes setores.

E essa proposta atualiza os índices com base em que dados?
Ela utiliza os Censos Agropecuários de 1995 - 1996, não chega nem a utilizar o de 2006, até porque a proposta foi feita antes de o Censo ser liberado, e utiliza também os estudos da Embrapa e uma série de estudos para fazer a atualização desses índices. Mesmo utilizando os dados da década de 1990, melhoraria substancialmente em relação aos índices de produtividade de 1975. De lá para cá, os índices médios de produtividade subiram substantivamente.

Para além desta discussão do limite e dos índices de produtividade, existe a proposta de um novo modelo para a agricultura brasileira levantado pelos movimentos sociais do campo. Quais são as bases deste modelo?
A proposta do movimento e de setores que trabalham próximos aos movimentos do campo vai em quatro direções fundamentais. A primeira é a necessidade de romper com a histórica concentração fundiária, porque isso produz injustiça e desigualdade. A segunda é chamar atenção para o processo recente de internacionalização que a agricultura brasileira vem sofrendo, que se expressa também na compra de terras pelos estrangeiros.– Parece que agora o governo tentará alguma medida de restrição a isso, mas problema não se resume à compra de terras. Essa questão passa, por exemplo, pela crescente dominação das empresas transnacionais sobre a agricultura brasileira, impondo um aporte tecnológico com sementes, agroquímicos e a própria compra da produção agropecuária que cada vez mais é controlada pelas grandes empresas internacionais. A terceira crítica é que, em função do latifúndio, há uma tendência cada vez maior de que se privilegie no Brasil a produção de matérias primas industriais e produtos para exportação, que interessam aos grandes grupos estrangeiros, e não a alimentação da população brasileira. Cada vez mais tem se ampliado no Brasil a produção de soja, de milho, de cana de açúcar, monoculturas de eucalipto e de pinho para produzir celulose, contra a área destinada à produção de arroz, de feijão, dos alimentos básicos. É um modelo produtivo que atende a interesses externos e não àquilo que seria fundamental para ampliar a segurança alimentar da população brasileira. E o quarto elemento fundamental é que este modelo agrário vem acompanhado de uma lógica da violência, que expulsa trabalhadores do campo de forma violenta, realiza o trabalho escravoe explora altamente o trabalho daqueles poucos que sobram no campo. Um exemplo é a situação dos cortadores de cana que, para competir com as colheitadeiras. têm que aumentar cada vez mais a produtividade do seu trabalho, e isso implica jornadas cada vez mais exaustivas e problemas de saúde cada vez mais danosos aos trabalhadores. O outro elemento que também é conseqüência deste modelo é a devastação ambiental, o avanço sobre as florestas - está aí a pressão toda para se mudar o Código Florestal para poder avançar ainda mais este processo de desmatamento. E aliado a isso há também um crescente uso de agroquímicos que fazem do Brasil hoje o campeão no uso de agrotóxicos, com um grau cada vez mais intenso de contaminação dos alimentos que ingerimos. É nesse sentido que os movimentos tem se contraposto a isso com o limite da propriedade da terra, a proposta da agroecologia como base de uma produção que ao mesmo tempo evite a devastação e conviva com os ecossistemas de forma mais equilibrada, e, sobretudo, não use essa enormidade de agrotóxicos que vem sendo utilizada. Esta proposta se baseia também em relações de trabalho muito mais justas do que as que estão colocadas atualmente.O conjunto desaas coisas é que está colocado como o contraponto da articulação. A crítica a esse modelo agrário dominante se rebate na defesa de um outro modelo que embasaria a proposta de reforma agrária, com base na democratização das condições de vida no campo e na rejeição desaas características que estão postas com este modelo - violência, superexploração do trabalho e devastação ambiental.

De acordo com a marcação do Incra, propriedades com mais de 15 módulos fiscais são consideradas grandes. Então, mesmo com a limitação em 35 módulos fiscais proposta pelo plebiscito, ainda teremos grandes propriedades no país. O que precisa ser esclarecido nesse sentido à população?
Pela legislação brasileira, imóveis de um a quatro módulos fiscais são considerados como pequena propriedade, de cinco a 15 são média propriedade e, acima de 15, grande propriedade. E o módulo varia de região para região de acordo com qualidade do solo, clima, infraestrutura, proximidade dos mercados. Tudo isso influi na definição do módulo fiscal de tal maneira que há módulos de 5 hectares, próximos aos grandes centros, até 110 hectares, que é o maior que temos no Brasil. Com a proposta do limite em 35 módulos fiscais, o tamanho variará de 175 hectares, próximo aos grandes centros, o que é muito, até 3.500 hectares em áreas mais distantes como a Amazônia. Veja que a proposta não está propondo acabar com a grande propriedade, que é acima de 15 módulos fiscais, está apenas acabando com as gigantescas - trata-se de reduzir a desigualdade e não acabar com ela. Então, não é no nível de radicalidade que alguns países fizeram. Há países no mundo que estabeleceram limites muito mais restritos para a propriedade da terra, como no Japão, onde o limite é de 12 hectares, ou na Coréia do Sul, que é de três hectares. O limite que estamos propondo para o Brasil chega a 3.500 hectares e isso significa que propriedades do tamanho de aproximadamente 3.500 campos de futebol poderiam ser permitidas no país, variando de região para região. É uma proposta extremamente eficaz porque, atingindo apenas 50 mil imóveis, o que corresponde a 2% dos imóveis rurais do Brasil, seria possível obter 200 milhões de hectares para a reforma agrária. Isso corresponde a quase 40% do total da área dos imóveis do Brasil. Portanto, atingindo muito poucos, permitiria-se um avanço muito grande da reforma agrária, beneficiando muitas populações do campo e da cidade. É uma medida com impacto extremamente positivo do ponto de vista social no Brasil.

Existe uma dimensão da demanda por terra no país?
Existem várias projeções em relação a isso. Há aquelas que trabalham com número de famílias acampadas, que seria a demanda mais direta pela terra, cuja estimativa é de 150 a 200 mil famílias acampadas. Tem uma estimativa que toma como base uma proposta do governo Fernando Henrique, de cadastro de interessados via correio, que chegou a 800 mil famílias cadastradas. E há dados do Censo Agropecuário que apontam os que seriam os assalariados em condição precária no campo: os arrendatários, parceiros, de forma geral, os trabalhadores rurais sem terra - que chegariam a quatro milhões de famílias aproximadamente. Se agregarmos isso ainda a milhões de famílias que foram expulsas do campo e vivem precariamente nas cidades, e algumas delas podem ter interesse em voltar para a terra, isso poderia chegar a 10 milhões de famílias. Há variadas possibilidades de mensurar, desde a forma mais direta até a mais indireta. E de fato a medida poderia resolver tranqüilamente essa demanda. Neste sentido, o plebiscito é muito importante como instrumento de mobilização, de conscientização da sociedade em relação aos seus problemas, assim como os outros plebiscitos populares, como o da Alca, o da Vale e o da Dívida Externa. O objetivo, sobretudo, é provocar o debate na sociedade sobre a importância destas questões. E neste caso, a importância fundamental que tem a reforma agrária para o campo e para a cidade, para transformar esta realidade brasileira. O plebiscito tem dois objetivos fundamentais: o primeiro é o de colocar o debate para a sociedade, e o segundo é, através do número de votos que se obtiver e das assinaturas que irá se recolher neste processo, poder impulsionar a proposta de emenda constitucional que visa a estabelecer efetivamente o limite para o tamanho da propriedade no Brasil. Não temos ilusão de que isto será uma batalha fácil, pelo contrário, mas é através do plebiscito que se coloca isso mais amplamente para a sociedade, o que pode vir a gerar a pressão popular necessária para que isso possa acontecer. De alguma forma o plebiscito da Alca teve esse efeito, pelo menos tensionou o governo brasileiro para a questão e demonstrou que havia uma quantidade expressiva de brasileiros que rejeitava a proposta da Alca.

FONTE: http://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/entrevista/limite-da-propriedade-de-terra-no-brasil-nao-acabaria-com-grandes-propriedades