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quinta-feira, 21 de abril de 2016

O PROJETO HIDROAGRÍCOLA DO FLORES – ESPERANÇA E DESILUSÃO.


Com a preocupação de solucionar os problemas em consequência das enchentes periódicas nas regiões do curso médio e baixo do rio Mearim e a necessidade de executar projetos que viessem favorecer o desenvolvimento sustentável de regiões com potenciais naturais (hídricos, principalmente), o Governo Federal, através do Programa Nacional de Irrigação – PRONI, buscou a promoção de projetos dessa natureza. É dessa iniciativa que nasce o “O Plano Geral do Mearim e Afluentes” e, seu apêndice – O Projeto Hidroagrícola do Flores. 

O Plano Geral do Mearim previa a construção de cinco barragens: Barragem do Flores, Barragem de Grajaú, Barragem do Catete, Barragem Madail e Barragem Marianópoles, das quais apenas a primeira fora realizada, sendo a mesma uma das etapas do Projeto Hidroagríciola do Flores, pois como sugere o nome, também era previsto a criação de unidades produtivas a serem localizadas em cinco áreas próximas, valendo-se de tecnologia de irrigação, com o devido apoio de técnicos especializados. Assim o governo pretendia os seguintes objetivos:
  • Criação de 750 empregos diretos e 2.200 indiretos na área 1 e 2; 
  • Incorporação de áreas ao processo produtivo do estado, através do efeito multiplicador de novas práticas de cultivo e de novas opções de exploração; 
Regularização de suprimento alimentar básico, com a implantação de uma economia mais sólida com base na adoção de culturas permanentes, que, além de atingirem patamares de renda significativamente mais elevados, proporcionarão um sistema de exploração integrado e mais rentável.

Essas cinco unidades produtivas seriam distintas e independentes, totalizando 1800 hectares, divididas da seguinte forma: duas áreas pilotos (2 e 4) com 250 ha. cada uma, localizadas à margem esquerda, e mais três (1, 3 e 5), com um total de 1.300 há situadas à margem direita do rio Flores.

Para a efetiva implantação dos núcleos produtivos dentro do perfil apresentado deveria ser garantido:
  • Agrovias (estrada de acesso para o escoamento da produção agrícola);
  • Núcleo habitacional;
  • Caixa de passagem;
  • Linha fixa de adução para irrigação por asperção;
  • Rede de drenagem;
  • Rede viária.

Além disso, o Projeto deveria contar com o envolvimento e a articulação integrada de diversos órgãos públicos:

  • DNOS/Ministério de Irrigação – responsável pelos estudos e obras implantação do Projeto;
  • Secretaria de Desenvolvimento Rural e Irrigação – coordenação dos trabalhos de treinamento de colonos, estruturação e operacionalização do Projeto;
  • Iterma – participa do processo de seleção, cadastramento e assentamento dos produtores através de concessão de documento de direito real de uso;
  • Fetaema e Sindicatos Rurais – participam das ações referentes ao cadastramento e seleção dos agricultores beneficiários do Projeto;
  • UEMA – Instalação no projeto, unidade de demonstração, treinamento e pesquisa;
  • EMATER – Trabalhos de assistência técnica e extensão rural;
  • Secretaria de Saúde – medicina preventiva e curativa;
  • Secretaria de Educação – desenvolvimento de ações específicas de sua, voltadas para as famílias dos irrigantes.
Como se demonstra acima, o Projeto Flores era fantástico, o que possibilitaria um salto qualitativo no desenvolvimento econômico e social  da região central do Maranhão. Entretanto, fora irresponsavelmente abandonado pelo governo estadual e federal, e, diante de governos locais dos municípios atingidos pela Barragem do Flores, sem qualquer visão futurista, e, ainda, sem organização dos movimentos sociais, o Projeto passa da esperança à desilusão.  

O Brasil no Contexto do Regime Militar - A economia e o atraso da construção da Barragem do rio Flores.

Durante a década de 1970, o Brasil vivia o um período de euforia econômica que ficou conhecido como “Milagre econômico”, devido às altas taxas de crescimento da economia, graças ao modelo desenvolvimentista de estímulo a indústria, a partir de recursos adquiridos em forma de empréstimos junto a investidores externos. Foi de fato um período em que governo brasileiro abriu literalmente o mercado nacional para investimentos de grupos internacionais, e com muitos estímulos e concessões por parte dos governos militares, como: isenção de impostos; concessão de grandes faixas de terras, verdadeiros latifúndios; investimentos do governo em infra-estrutura – modernização de portos, construção de rodovias, ferrovias, etc.; ausência de uma rígida política de fiscalização ambiental; subsídios de energia; mão-de-obra a baixo custo, entre outras vantagens.

Nesse contexto o Brasil tornou-se conhecido pelas grandes obras públicas como a ponte Rio - Niterói, a hidrelétrica de Itaipu e a rodovia Transamazônica. O Governo Federal e os governadores estaduais não mediram esforços para a viabilização de projetos colossais, que por sua vez não eram acompanhados por projetos sócio-ambientais, como sublinha Boris Fausto:

“O ‘capitalismo selvagem’ caracterizou aqueles anos e os seguintes, com seus imensos projetos que não consideravam a natureza nem as populações locais. A palavra ‘ecologia’ mal entrara nos dicionários e a poluição industrial e dos automóveis parecia uma bênção. No governo Médici, o projeto da Rodovia Transamazônica representou um bom exemplo desse espírito. Ela foi construída para assegurar o controle brasileiro da região – um eterno fantasma na óptica dos militares – e para assentar em agrovilas, trabalhadores nordestinos. Após provocar muita destruição e engordar as empreiteiras, a obra resultou em fracasso.” (FAUSTO 1995).

Embora a construção da Barragem do rio Flores tenha sido iniciada em 1982, e, portanto, no final do Regime Militar, a sua gestação deu-se nesse contexto entusiástico vivido na década anterior, a qual o Brasil era visto como o “País do Futuro”, sob o prisma de uma emergente e gloriosa nação que caminhava rapidamente para a grandeza industrial. Entretanto, a adoção dessa política econômica traria resultados desastrosos para a grande maioria da sociedade brasileira, pois a economia não conseguiu manter as altas taxas de crescimento do final da década de 1960 e da primeira metade da década de 1970.

Podemos afirmar que o limite interno, originado da má distribuição de renda, impedia a expansão continuada do consumo. A isso se soma o limite externo, proveniente das altas do preço do barril do petróleo, a partir de 1973, e a conseqüente diminuição de capital internacional barato que acabaram por inviabilizar o projeto de crescimento econômico continuado.

Esse cenário de crise e recessão explica em parte as dificuldades para disponibilizar as verbas orçadas para a implementação do Projeto Flores, cujas obras o DNOS daria início no biênio 1979-1980, mas somente no ano de 1982 foram efetivamente iniciadas.

HISTÓRICO DO PROJETO FLORES


O Projeto Hidroagrícola do Flores fora um desdobramento do Plano Geral do Mearim e Afluentes (criado em 1978), o qual previa uma série de obras para resolver o problema das enchentes e consequentes prejuízos ocasionados às populações ribeirinhas ao longo do curso do rio Mearim [...].

Outros fins oficialmente declarados do Projeto Flores seria a implantação de núcleos agrícolas às margens do Flores, a partir da utilização de tecnologia de irrigação, como forma de beneficiar pequenos produtores, e, por conseguinte a promoção do desenvolvimento sustentável da região. Também era previsto o aproveitamento do potencial hídrico para a produção de eletricidade.

No entanto, sua prioridade mais urgente seria solucionar o problema das enchentes, especialmente nas cidades do vale do Mearim – Pedreiras, Trizidela do Vale, São Luiz Gonzaga, Bacabal, Vitória do Mearim e Arari. Estas a cada inverno mais rigoroso se deparavam com verdadeiras calamidades.

Em relação ao problema, o Jornal Pequeno publicou uma matéria intitulada: “Presidente João Goulart autorizou a Construção da Barragem do Rio Mearim – ATENDIDO PELO PRESIDENTE A SOLICITAÇÃO DE EURICO RIBEIRO E DEMAIS TRABALHISTAS”, dias antes do Golpe de 1964, no qual este presidente foi deposto:
“Procedente do Rio de Janeiro, encontra-se, nesta cidade, o vereador Artur Lacerda de Lima, integrante da bancada do PTB do legislativo municipal de Pedreiras. O edil sertanejo participou da reunião dos deputados Cid Carvalho, Luís Coelho, Alberto Aboud, Eurico Ribeiro e o engenheiro Remi Archer, com o presidente João Goulart no Palácio das Laranjeiras, quando foi examinada a tragédia das enchentes e a ajuda do governo Federal às vítimas do flagelo.
Nesse encontro do chefe da nação com os membros do bloco petebista na Câmara Baixa do País, foram traçadas as medidas imediatas de socorro às populações dos vales do Mearim e do Parnaíba, atingida pelas inundações. Diante da dramática situação o deputado federal Eurico Ribeiro, inclui no orçamento da República a verba de 400 milhões de cruzeiros, além de outros auxílios através dos seguintes órgãos SPEVEA, SUDENE e DNOS, destinados à construção de uma grande barragem no rio Mearim, evitando que se repitam os anos, o doloroso drama das enchentes, que assolam rica região do Estado, devastando lavouras e habitações, arrastando tanta gente humilde ao sofrimento, a fome e o desespero. A referida obra, velho anseio do povo do fecundo Vale do Mearim.
O vereador Artur Lacerda de Lima conseguiu do Ministério da Agricultura, por intermédio dos deputados Cid Carvalho, 25 milhões de cruzeiros, para o auxílio à lavoura de Pedreiras, destruídas pela enchente. Conseguiram também, junto ao ministério da saúde uma ambulância para transportar enfermos aos hospitais e a instalação do SAPS naquela cidade ribeirinha. Onde funcionará também dentro em breve uma agencia do Banco Nacional de Crédito Cooperativo. Para assistência econômica aos homens do campo.
Chegará domingo a São Luís o deputado Federal Eurico Ribeiro, em companhia do deputado Cid Carvalho aonde os dois parlamentares petebistas irão a Pedreiras para examinar a situação das enchentes naqueles naquele município.
Deverá visitar também a princesa do Mearim o engenheiro Remiu Archer e o presidente do Banco Nacional de Crédito Cooperativo, que está sendo esperado hoje nesta capital. ”
(JORNAL PEQUENO, 26/03/1964).
A "Barragem do Mearim" citada acima é a mesma do Flores, pois teria sido, o já falecido, deputado federal Eurico Ribeiro o primeiro político maranhense a levantar o problema das enchentes e sugerido o barramento do rio Flores e o Mearim como solução. Através do projeto nº. 2976, publicado no Diário do Congresso Nacional em 20 de maio de 1961. Evidentemente, motivado pela catastrófica cheia de 1961, ressaltando ainda, que a enchente de 1933 marcou sua vida, pois seu pai residente na cidade de Pedreiras, “perdera quase tudo que possuía: uma usina de beneficiamento de arroz e algodão e uma loja de tecidos, ferragens e miudezas.” (RIBEIRO, 1986).

Para Vaz em, “O Projeto Flores: Solução e Problema”, o:

“Projeto Flores é a denominação dada a uma etapa do Plano Geral do Mearim e Afluentes, elaborado em 1978. O Plano visava à construção de várias barragens no rio Mearim e seus afluentes, a fim de conter as cheias deste rio, evitando a situação de calamidade vivida pelas populações ribeirinhas a cada inverno rigoroso. Ao mesmo tempo, buscava melhorar a situação do transporte através do Mearim e proporcionar condições de aproveitamento do seu potencial agrícola e energético.

O Projeto Flores foi a etapa inicial do Plano, compreendendo a construção de uma barragem na confluência dos rios Mearim e o seu afluente Flores e a implantação de projetos de agricultura irrigada.” (VAZ, p. 8).

Segundo a Assessória de Comunicação Social da Secretaria de Desenvolvimento e Irrigação – SRD, os estudos da Barragem do Flores foram iniciados em 1964. Naquela época o Departamento Nacional de Obras e Saneamento – DNOS procurava uma maneira mais viável para controlar definitivamente os problemas causados pelas cheias, nos vários municípios ao longo do Mearim. Paralelamente, os estudos técnicos identificavam naquela região, solos férteis com elevada aptidão para o uso com tecnologia de irrigação.

Mas, durante uma década os estudos de levantamento ocorreram em ritmo muito lento, e, somente a partir da histórica cheia de 1974, a qual mais uma vez arrasou a cidade de Pedreiras é que o Governo Federal passou a ser pressionado para intensificar as ações que viessem de fato resolver o problema. Porém, somente em dezembro de 1977 é que o Ministro do Interior Maurício Rangel Reis, através de correspondência, presta esclarecimentos ao ministro-chefe do Gabinete Civil da Presidência da República general Golbery do Couto e Silva, sobre a elaboração de um plano geral dos recursos naturais do vale do Mearim e afluentes:

“Senhor Ministro,
Refiro-me ao Aviso nº1340, datado de 14 de outubro do corrente ano, através do qual Vossa Excelência encaminhou-me expediente do Senhor Deputado Eurico Ribeiro (ARENA), no sentido de ativação dos estudos da bacia dos rios Mearim e Flores.
O DNOS, no âmbito do convênio celebrado com a PORTOBRÁS, ‘para a elaboração do estudo e projeto geral de aproveitamento e controle dos recursos de águas e solos das bacias dos rios Mearim, Grajaú, e Pindaré, no estado do Maranhão’, contratou a elaboração de um plano geral de controle e aproveitamento dos recursos de água e solos dos vales do rio Mearim e afluentes”. (RIBEIRO, 1986).

Neste fragmento pode-se claramente perceber o engajamento do deputado Eurico Ribeiro na busca de solucionar o flagelo dos ribeirinhos do Mearim. 

Contudo, para compreender melhor o processo de gestação do Plano Geral do Mearim e Afluentes, e, por conseguinte, do Projeto Flores, se faz necessário uma análise do modelo de política econômica adotada pelos governos militares. Mas tal análise merece uma postagem específica.

O que buscamos demonstrar aqui foi um breve histórico de como foi gestado o Plano Geral do Mearim e seus Afluentes, projeto cujo desdobramento fora a construção da Barragem do rio Flores. A obra de maior impacto na história de TUNTUM.

Fonte: GONÇALVES, Jean Carlos. A história da Barragem do rio Flores - Esperança e desilusão para o município de TUNTUM-MA. 2007. (Texto adaptado).