Por Jean Carlos Gonçalves*.
Fonte: Wikipédia |
A cada ano, sempre que se aproxima o dia 12 de setembro, a data escolhida pelos primeiros governantes locais para se comemorar a emancipação política de Tuntum-MA, se revigoram alguns questionamentos sobre o processo histórico que culminou na Lei nº 1362/1955, que estabeleceu emancipação.
É motivo de inquietação o fato de acontecimentos impactantes e de importantes personagens, que protanizaram a façanha da emancipação, permanecerem praticamente ignorados e/ou esquecidos, salvo em raras situações esporádicas, isoladas.
Nomes de saudosos homens públicos como Eurico Bartolomeu Ribeiro, promotor de justiça, secretário de Estado, deputado estadual, deputado federal, o governador do Maranhão mais jovem da história (aos 28 anos governou interinamente o Estado - 26/03/1956-09/07/1967); Ariston Leda, empresário, vereador e primeiro prefeito eleito de Presidente Dutra e também o primeiro chefe do poder executivo eleito de Tuntum; Eugênio de Barros, exitoso empresário, prefeito de Caxias-MA, por dois mandatos senador da República e governador do Maranhão que sancionou a lei supracitada. Tais personagens da política maranhense não devem ser relegados ao esquecimento ou desconhecimento para esta e às futuras gerações. Assim como não se deve ignorar o protagonismo dos vários segmentos sociais, muitos deles até agora anônimos, que faziam de Tuntum um importante núcleo de povoamento na primeira metade da década de 1950.
Hoje o nomes de Ariston Leda e Eugênio de Barros dão nomes a ruas que embora importantes, não medem 500m. A praça Eurico Ribeiro foi totalmente descaracterizada: construíram uma biblioteca e a sede do Serviço de Atendimento Médico de Uugência - SAMU. Este se localiza inadequadamente, uma vez que o ideal é que fosse na saída da cidade no sentido ao povoado Araras, o mais próximo possivel da BR-226. Muito pouco para quem protagonizou a emancipação, numa época que não havia plebiscito, a população não era consultada, tudo ficava a cargo da iniciativa dos agentes políticos, independemente se seriam beneficiados particularmente, não é esse o ponto discutível. Não se pretende aqui exaltar feitos heróicos de ocupantes de cargos de poder, mas tão somente de conferir a devida relevância de suas atuações para a independência política de Tuntum e os mesmos são ignorados, ou quase totalmente desconhecidos pelas gerações recentes.
Obviamente, as famílias pioneiras, seus destacáveis representantes, os retirantes que chegaram nos famosos paus-de-araras, fugindo do flagelo das secas nos demais estados nordestinos, ou mesmo os que chegaram a pé, tocando uma mula, um jumentinho, trazendo uma pequena bagagem e os seus pequeninos filhos no meio da carga, também devem ter lugar reservado na memória desta geração presente, pois foram aqueles homens e mulheres que representaram uma verdadeira explosão demográfica e, por conseguinte, elevaram a importância do povoado. Foram eles, jornaleiros dinâmicos, trabalhadores, guerreiros destemidos, obstinados, que cotidiana e coletivamente atrairam interesses de outros para essa parte da Zona Fértil da Mata do Japão, o Eldorado, e, assim, favoreceram as condições necessárias para as ações daqueles agentes públicos, que por sua vez, assumiram a vanguarda do processo histórico que tranformaria um dos mais promissores povoados do município de Presidente Dutra, em novo ente da federação.
Conhecer a nossa história, resgatar personagens, fatos e processos históricos, além de ser uma questão de justiça para com a memória daqueles que desbravaram, edificaram e construíram o tecido social tuntuense, é também um direito inalienavél dos munícipes do presente, especialmente, das crianças e jovens, dequele(a) que passam pela Av. Drº Joaci Pinheiro, por exemplo, para chegar até o colégio, ou ainda daqule(a) que estuda na Escola Municipal José Teixeira, EM Maria Secretária, Centro de Ensino José Pinheiro, Centro de Ensino Isaac Martins, ou ainda daqueles que procuram atendimento médico numa Unidade Básica de Saúde como a Raimunda Basílio ou Rita Pinheiro Coelho e ignoram, quase completamente ou sequer detem informações elementares desses importantes sujeitos históricos, que nomeiam fachadas dos prédios e logradouros públicos da cidade e do município.
Se conhecer o passado é uma questão de justiça, de direito fundamental e social, uma via para extirpar a ignorância, então, somente se apropriando do conhecimento histórico local é que o indivíduo desenvolverá um sentimento de afetividade, de pertencimento para com o lugar de origem e, a partir daí, assumir uma postura cada vez mais ativa, consciente, dígna, enfim, de pleno exercício de cidadania. Nesse sentido, logo se faz necessário e urgente uma política pública de fomento a consciência histórica voltada à sociedade geral, mas primordialmente, para a classe estudantil do município de Tuntum.
Aqui se assiste por sucessivas décadas uma verdadeira inação, apatia ou mesmo má vontade dos governos locais, no tocante, a uma política de fomento da consciência histórica. Praticamente nada fora feito ao longo de quase sete décadas de autonomia política. Seja pela própria ignorância dos gestores, e daí a falta de sensibilidade, seja pelo pragmatismo político, de entender que tal conhecimento não é tão relevante, não é priordade, não gera capital eleitoral, que investimentos nessa área não garante a perpetuação no cargos de poder. E quando constroem alguma narrativa no passado, o fazem sem critério, com metodologia duvidosa, propalam um discurso carregado de intenciaonalidades, no qual omitem, distorcem fatos, exaltam determinadas figuaram políticas e sociais, em detrimento de outras, destroem o que os adversários construíram, representam um município a sua imagem e semelhança, romantizando, evocando um passado ufanista seletivo, que silencia e exclue determinados grupos e personagens que protagonizaram e/ou antagonizaram fatos e processos históricos importantes.
Contudo, vale ressaltar que algumas iniciativas de pesquisa, de resgate da memória histórica de Tuntum de modo mais sistematizadas foram implementadas nos últimos anos, fruto da iniciativa de alguns acadêmicos e de algumas escolas do município, mas ainda de modo isolado, ou seja, as iniciativas tomadas não são fruto de uma política pública estruturada e definida. Entretanto, precisa-se louvar e reconhecer as ações dos profissionais da educação do município, que de algum modo instigaram mais recenemente, em seus estudantes a curiosidade pela história do município.
Mais recentemente destacamos a importantíssima ação da Secretaria Municipal de Educação que tem como titular a Profª de História Antonia Morais Gomes. Pois fora no último feriado de 7 de Setembro, a culminância do projeto para as comemorações do bicentenário da Independência do Brasil, ocasião em que se celebrou a história do município - AMADO "TUNTUM PEDAÇO BRASILEIRO: História vivida, geram memórias!", como temática para a grande festa cívica: o tradicional desfile das escolas da rede municipal de ensino, que apresentaram nas ruas da cidade uma verdadeira aula de história de Tuntum. Foi marcante, especialmente por garantir uma das tradições que fora interrompida em 2020 e 2022, devido a pandemia do covid-19. Foi maravilhoso assistir a execução do Hino Nacional Brasileiro, o Hino Municipal pelos acordes da sanfona e destreza do grande Wilson Boré. Assistir a apresentação de cada escola, de cada pelotão, contando parte da nossa história foi sensacional e nos encheu de esperança.
Pois sabemos que para tal ação, a equipe técnica da Secretaria de Educação e as equipes escolares, indubitavelmente, se debruçaram sobre os aspectos geo-históricos do município. Pesquisas foram realizadas, leituras foram compartilhadas, textos foram produzidos e reproduzidos, socializados. É desse movimento em rede, contínuo, initerrúpto que precisa ser implementado nas escolas, nas demais instuições socias, como uma política pública e não como evento circustâncial.
Nesse sentido, a atual gestão municipal tem acenado positivamente, demonstrado preocuação, acerca da urgente necessidade de construção de uma identidade coletiva, alicerçarda na pesquisa e produção do conhecimento histórico, a partir da realidade concreta da sociedade tuntuense.
Assim sendo, eis que surge mais latente o otimismo, a esperança de que a conciência histórica seja alimentada diariamente e, nesse sentido, compete ao poder público municipal assumir a vangarda desse movimento.
A Gestão Municipal de Tuntum e suas autarquias da Educação e Cultura não devem se furtar dessa oportunidade histórica, de fazer um trabalho sistêmico, científico, de resgate da memória, de arquivamento, de valorização e conservação da produção histórica, artistica e cultural. É chagada a hora de inovar, de fazer diferente, tempo de escrever a nossa própria história com lucidez, como conhecimento científico, despido de parcialidades.
Há muito por fazer: precisamos de um núcleo de pesquisa com o incondicional apoio da gestão municipal; sistematizar uma proposta para o consumo do conhecimento a ser produzido pelo público estudantil; assegurar formação continuada aos professores da rede pública municipal; planejar e executar projetos de pesquisa nas unidades de ensino, em cada sala de aula, a partir da realidade do entorno da escola e da trajetória de vida dos estudantes. Essa construção é e sempre será coletiva.
O que hoje somos é produto da ação de homens e mulheres que nos antecederam no tempo, portanto, não se deve ignorá-los ou reduzir a sua importância, pois todos ajudaram a construir a nossa história. Desse modo, precisamos de formatar essa identidade comum, aguçar o sentimento de pertencimento para com Tuntum, para continuarmos conduzindo o destino deste município. O passado deve atribuir sentido a vida presente, nortear as decisões, as escolhas, para que não incorramos nos equívocos até então cometidos. Não podemos abdicar dessa missão histórica.
Neste dia 12 de setembro, sim, devemos reconhecer a iniciativa dos homens que lideraram o processo de emancipação de Tuntum, mas não podemos omitir, menosprezar, ignorar os primeiros desbravadores, as famílias pioneiras na ocupação da cidade e dos mais longícuos rincões do município. Não podemos esquecer dos trabalhadores, empreendedores, dos tipos humanos - vaqueiros, quebradeiras de coco, lavradores, tropeiros, mestres de ofício, missionários evangelizadores, parteiras, rezadeiras, profissionais liberais, vendedores ambulantes, enfim, todos aqueles que até agora são anônimos, que foram silenciados intencionalmente ou não. Já se esgota a hora de tirá-los do cárcere do tempo passado inexplorado. Vamos juntos libertá-los das masmorras do vil esquecimento?
Hoje, é mais um dia para rememorar os artífices de nossa história e de também valorizar os que ora constroem cotidianamente o nosso município e que mantem a nossa identidade cultural, pois somos herdeiros de um passado comum apesar da diversidade filosófica, política, religiosa, etc, que constitue a nossa sociedade.
Lembrem-se da máxima! "Um povo que não conhece a sua história está fadado ao fracasso.". Ou como diria o poeta cubano Palho Milanés:
"E quem garante que a História
É carroça abandonada
Numa beira de estrada
Ou numa estação inglória
A História é um carro alegre
Cheio de um povo contente
Que atropela indiferente
Todo aquele que a negue
É trem riscando trilhos
Abrindo novos espaços
Acenando muitos braços
Balançando nossos filhosQuem vai impedir que a chama
Saia iluminando o cenário
Saia incendiando o plenário
Saia inventando outra trama"
Ainda há tempo.Vamos iluminar o cenário?
Parabéns ao povo de Tuntum pelos os seus 67 anos de emancipação política!
Profº Jean Carlos Gonçalves, administrador do Blog Ecos de Tuntum. |
___________________
*É Professor de História da rede pública municipal de Santa Filomena do Maranhão e da rede pública estadual do Maranhão.
6 comentários:
Shalom
Parabéns Professor Jean Carlos!
Uma Crônica Histórica e de fôlego, contudente e propicia muitas indagações sobre o trabalho, coragem e determinação dos primeiros moradores do Coração da Mata do Japão, chamado Tuntum, cujos atos de bravuras foram propagados por muitas gerações, todavia aos poucos, foi perdendo sua intensidade, com o passar dos anos, e hoje em dia, temos muitas lacunas da nossa história em aberto, à espera de pessoas determinadas que queiram, buscar no distante passado, os resquícios, ecos da história dos Pioneiros Povoadores, deste Torrão de todos nós, filhos da Terra, e cabe a todos o desejo de participar desta reconstrução histórica.
Parabéns Cidade de Tuntum, por tua bela e rica história, pelos 67 Anos de Emancipação Política Administrativa, entretanto, é imperioso, e faz se necessário, que teus filhos, tenham vontade e desejo, em melhor ti conhecer.
Palmas - Tocantins,
11 de Setembro de 2022.
Creomildo Cavalhedo Leite.
E-mail: creomildo04@gmail.com
O Professor Jean Carlos, professor/pesquisador, tem se tornado uma referência de leitura obrigatória quando se trata da história da Mata do Japão maranhense. Este texto, de fôlego, sobre os 67 anos de Tuntum traz vários viés de um cronista histórico dos melhores deste Estado, deste país. Parabéns!
Um texto brilhante feito por alguém que ama, respeita e se preocupa com terra que o acolheu como faria a um filho nascido no seu próprio chão. Parabéns ao nobre e pujante município, terra da fartura e da promissão.
Muito obrigado, meu caríssimo amigo. És grande referência para nós!
Quanta deferência, nobre Guardião das Letras! Muitíssimo obrigado!
Muito agradecido, dileto amigo e grande pesquisador de nossos Sertões!!
Avante!!
Postar um comentário