Por Euges Silva de Lima*
Palácio dos Leões, sede do Governo do Maranhão, marco zero da cidade
A presença francesa no Norte do
Brasil, no século XVII, deve ser entendida dentro do contexto das disputas
franco lusitanas. Num primeiro momento, meramente restrito à concorrência da
indústria extrativa do pau Brasil e outros gêneros tropicais, para depois se
tornar projeto de colonização com vistas a um estabelecimento permanente.
Embora de iniciativa particular, o projeto de colonização francesa em terras do
Maranhão contou com a chancela real.
Na medida em que a colonização
portuguesa foi se tornando mais efetiva ao longo do litoral brasileiro, os
franceses foram sistematicamente avançando em direção ao norte, as incursões
francesas à costa do Brasil no decorrer dos séculos XVI e XVII, ocorreram no
sentido sul/norte. Observe que as invasões gaulesas iniciaram-se no Rio de
Janeiro em 1555 e culminaram no Maranhão em 1615.
Isso se deve principalmente em razão
da união ibérica, em 1580. A exigência espanhola era que a ocupação e
colonização do Brasil se desse em direção ao norte, ao contrário do que estava
acontecendo até então (sentido sul). A intenção espanhola era proteger suas minas
localizadas na região do Peru, de possíveis invasões estrangeiras.
O Maranhão e o Amazonas constituíam
portas de entradas para essas regiões mineradoras. É nesse sentido que a
colonização portuguesa, pós união peninsular, coincidiu com o banimento dos
franceses dessas regiões mais localizadas ao norte. O Maranhão passou a ser
alvo dos franceses, na medida em que constituía ainda uma das poucas áreas
restante do litoral brasileiro livre da ação portuguesa.
Embora o nome de Daniel de la Touche,
Senhor de la Ravardière seja comumente evocado como o principal líder da
expedição francesa às terras maranhenses, é necessário, contudo, ressaltar a
imprescindível participação de François de Razilly nos preparativos e
administração dessa empresa, não só em termos religiosos como sugeriu o
capuchinho francês Claude d’Abbeville, mas principalmente no que diz respeito à
articulação para reunir recursos para o bom andamento dos negócios.
O projeto: França Equinocial era
uma empresa cuja liderança era dividida entre Razilly e La Ravardière, sendo
que em momento algum, o Senhor de Razilly assumira papel secundário. Se La
Ravardière assume posição de liderança principal nos acontecimentos finais de
1614 a 1615 no Maranhão, isso se deu, certamente devido à ausência de Razilly
que se encontrava na França.
Se por um lado, não podemos negar a
intenção francesa em fundar uma colônia em plagas do Maranhão, por outro lado,
os três anos e quatro meses que aqui permaneceram os franceses não foi tempo
suficiente para que eles se consolidassem, no sentido de estabelecerem uma
colônia propriamente dita ou até mesmo uma cidade. A chamada França Equinocial
não conseguiu criar raízes, o projeto francês ainda estava em andamento quando
da chegada dos portugueses.
A experiência francesa no norte do
Brasil, em todos os seus aspectos, não chegou a se consolidar enquanto modelo
de colonização típica do século XVII, as relações entre metrópole e colônia
durante 1612 a 1615 não foram tão regulares assim, a ponto de se estabelecerem
ali os fundamentos necessários que envolviam as relações metrópole e colônia,
típicas do sistema colonial. Portanto, mais pertinente seria entendermos essa
ocupação dos gauleses no Maranhão, como uma tentativa de colonização que foi
frustrada pela vinda dos portugueses e não fundação de algo no Maranhão, seja
uma colônia, seja uma cidade.
Na aventura francesa do Maranhão
seiscentista, os indígenas eram peças- chave nos métodos de cooptação dos
brancos. As alianças entre mairs (franceses) e Tupinambás, demonstram uma
relação com o “outro”, feita com base em negociações comerciais, ao mesmo tempo
em que também se constituía uma política para se viabilizarem em terras da
América.
Sem o apoio das tribos Tupinambás do
Maranhão, dificilmente os franceses tinham condições de se estabelecerem por
estas terras. Os “Papagaios Amarelos”, como eles eram chamados pelos indígenas,
tinha tanta consciência disso que procuram estabelecer leis que protegessem os
índios, pois sabiam que o sucesso da empresa, dependia, do bom relacionamento
entre os europeus, mas principalmente da relação amistosa entre franceses e
nativos.
Os Tupinambás que foram descritos por
cronistas franceses do início do século XVII, apesar de terem apresentados
características semelhantes dos que habitavam outras regiões do Brasil, estavam
razoavelmente preservados em sua cultura primitiva, visto o isolamento do
Maranhão da ação de colonizadores portugueses antes da chegada dos franceses.
Abbeville e d’Evreux, quando chegaram ao Maranhão em 1612, encontraram esses
índios quase nada modificado culturalmente, ao contrário de franceses lançados
em terras maranhenses, anterior à expedição de La Ravardière que já se
encontravam praticamente “indianizados”.
Os Tupinambás maranhenses procuraram
proteger sua comunidade, nesse sentido, a iniciativa em aliar-se aos franceses
ocorre da necessidade desses índios de se protegerem da dominação lusitana,
preservar sua cultura e suas próprias vidas. Emigrados de Pernambuco, fugindo
da escravidão imprimida pela ação colonizadora portuguesa, assim como, em busca
de uma possível “terra sem mal”, os Tupinambás buscaram estabelecer alianças
com os franceses que disputavam com Portugal a posse do norte do Brasil.
O sonho francês acalentado há muito
tempo em fixar um estabelecimento colonial no Brasil, mais uma vez não dá
certo. O norte brasileiro não pertenceria aos mairs e a dúvida que durou muito
tempo acerca da posse do território brasileiro, como assinalou o historiador
Capistrano de Abreu, se definiria a favor dos perós (portugueses). Depois da
derrota fragorosa na batalha de Guaxenduba e a partir da expulsão definitiva
comanda por Alexandre de Moura, chega ao fim a pretensão francesa em colonizar
o Maranhão. A França Equinocial entra, portanto para o rol das tentativas mal
sucedidas de ocupação francesa em terras brasileiras.
EUGES SILVA DE
LIMA é professor de história das redes públicas de
educação estadual do Maranhão e municipal de São Luís, com especialização em
teoria e metodologia para o ensino da história pela Universidade Estadual do
Maranhão (UEMA), secretário de Cultura do Sinproesemma e vice- presidente do
Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM.
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