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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Mestre Quinca Julião - Um dos Construtores de Nossa História!

Por Jean Carlos Gonçalves.
Joaquim José dos Reis, o Mestre Quinca Julião
Tenho refletido muito sobre o papel do indivíduo comum para a construção da história.
Fico pensando o quanto de trablalho é necessário para que um seleto grupo se torne personagens conhecidos e imoralizados pelas colossais obras da engenharia e arquitetura, a produção da arte, pelos próprios registros da história, que sempre fora um mecanismo de fazer culto a imagem dos "grandes homens", reconhecidamente heróis. Mesmo ciente de que não é reflexão inédita, insisto a pensar, posto que, não basta a simples constatação de coisas tão óbvias, mas de buscar a aplicação prática das conclussões que fazemos a cada exercício mental dessa natureza.

Coincidentemente, hoje fui apanhar meu filho na escola, quando virei a face, mirei sentado no banco aguardando seu netinho, também estudante da escola, um senhor de terceira idade de fisionomia vívida, considerando sua idade. Não hesitei, imediatamente bradei: 

- Mestre Quinca Julião!
- Diga Meu Amigo!

Na verdade eu esperava: - Fala, Meio Quilo! Sempre chamava assim, devido a minha massa muscular. Aproximei apertei-lhe a mão e sentir a mesma força de 25 anos atrás. Homem tinha força e aparentemente, o tempo não a dimuniu.
Mestre Quinca, aguardando o netinho no banco da
Escola Santa Gianna Beretta Molla. Costume diário
Joaquim José dos Reis, nascido em Tuntum em 1940, é um amigo desde inicio dos anos 1990. Eu contava apenas 11 anos de idade, ele homem na casa dos cinquenta. A grande diferença de idade, não impediu a amizade entre o homem e o menino, um moleque magricelo, que o saudoso Honorato Paraibano, tratou de reder-lhe a alcunha de Meio Quilo. 

Na casa de Honorato Paraíbano, Mestre Quinca, na roda que se formava todas as manhãs e tardes, no tabuleiro de damas, enchia a boca para dizer: Joga Meio Quilo! Quero ver tu te sair dessa! Perdeu Meio Quilo!

O moleque era abusado. O melhor de damas naquela época. A todos vencia, os adultos sofriam.  Impressionava. Despertava admiração de todos. Deixava Mestre Quinca e os outros perús (como se chama os espectadores do jogo), com a ligeira impressão de que ia perder, quando de repente, numa jogada final, como um mágico que tira um truque da  cartola, finalizava o adversário numa só jogada.

Os breves segundos entre aquele forte aperto de mão e o assento ao seu lado naquele banco, me conduziu a todas essas lembranças. Mas era necessário iniciar um diálogo para que o velho amigo não ficasse sem nada entender diante de meu silêncio momentâneo. Daí lembrei de Julião, seu pai, que somente conheci pelas conversas que sempre estabeleci como os mais idosos. Comecei a perguntar sobre Mestre Julião, e Mestre Quinca como muita empolgação relatou-me:
"Meu pai foi um antigo tirador de pedras na beira do riacho para construir a igreja. Eu também trabalhei com meu pai. Mas trabalhei muito para a Igreja quando o Frei Dionoísio era o vigário, nos anos 1970."
Ele apontou para o piso do corredor da Escola Santa Gianna Beretta Molla, antigo Centro Pastoral, com o dedo em riste apontou: "Esta vendo esse piso? Fui eu que botei. Veja aí se tem algum mosaico desses aí mais alto que o outro?"

E com um soriso de satisfação enfatizou: 
"Naquela época eu tinha vista boa! Trabalhei muito. Assentei todo o piso aqui da paróquia, desde a primeira sala até a última. Quem fez o rejunte do alto da torre da igreja fui eu. Além disso, trabalhei na paróquia de Dom Pedro e também na igreja do Alto Alegre. Lá naquele povoado que antigamente pertencia a Barra do Corda, onde os índios mataram os padres (Massacre de Alto Alagre, em 1901)."
Mestre Quinca, pisando sobre os mosaicos
que ele próprio assentou há mais de 45 anos.
Numa manhã inesperada, ganhei  um presente preciosíssimo de Mestre Quinca Julião, pois seu enriquecedor relato me fez voltar aquela reflexão inicial e fiquei impressionado como extraordinarimente, um homem tão simples, humilde, mas valorosíssimo, contribuiu tanto para a dinâmica da vida social de Tuntum, que a atual geração insiste em silenciar, omitir, reservando os lugares de destaque, exclusivamente, para as figuras que ocupam os cargos de poder.

A imagem que construi, ao longo dos anos, de Mestre Quinca foi de homem alegre e ao mesmo tempo muito sério e correto, mas que gostava muito de brincar com os mais jovens. Sempre foi dono de um sorriso e gargalhada inconfundível nas rodas de damas, ou no seu lugarzinho sagrado, de onde assistia as partidas no Velho Dom Adolfo Bossi, especialmente, para assistir seu filho Jerre, destacado atacante da Associação Esportiva Tuntuense e do Atalanta Futebol Clube de Tuntum, no inicio dos anos 1990.

Lembro que eu contava 10 ou 11 anos, quando assisti Seleção de Tuntum x Espressinho de São Luís e Seleção de Tuntum x América de Codó. Nas duas partidas o placar registrou 1 x 1 e Jerre marcou os gols. Só lembro de Mestre Quinca vibrando, eufórico com os gols do filho e após ouvir tantos elogios dos torcedores em volta, ao final das partidas, dizia, já com comedida felicidade, risonhamente falava para os que estavam próximo: "O Jerre é oportunista. Se vacilar ele faz!"

Eu de perto, criança espiava aquele homem esbanjando alegria, sabia que tinha como ofício a profissão de pedreiro, tudo era muito sem sentido para mim. Eu menino, não tinha dimensão da importância histórica daquele homem que tempos depois se tornaria um amigo através dos tabuleiros de damas e do jogo de 3-7 da Casa do saudoso José do Pedrão. Foi o acaso, um breve encontro na escola, que ele todos os dias religiosamente apanha o netinho,  e eu raramente busco o meu filho, que em poucos minutos rememorei tantas lembranças e descobri tantas proezas realizadas por aquele velho amigo.

Da união matrimonial com Dona Sebastiana, Mestre Quinca, teve além de Jerre, o primogênito, mais uma filha, a Jerreane.
Mestre Quinca, um dos construtores de nossa história
Um Homem de vida modesta, que pautou sua vida em virtudes, nos bons valores do trabalho e da família. De passado impoluto e caráter ilibado, que tanto fez por Tuntum, precisa ser colocado em seu devido lugar de importância na história local. É, portanto, dígno de nossa gratidão, respeito e reconhecimento. Pois, muitos que diariamente cruzam as salas e corredores daquela escola ignoram que aquele Grande Homem, diariamente pisa sobre os mosaicos, que de próprio punho, assentou há mais de 45 anos. 

Assim sendo, o Ecos de Tuntum apresenta Joaquim José dos Reis, o Mestre Quinca Julião, como um dos construtores de nossa história.

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